Entre a criação final do website e a vontade real do cliente muitas vezes se observa uma distância. É um assunto delicado, que passa pela dificuldade humana em expressar de maneira objetiva uma idéia subjetiva. Afinal, trata-se de criação intelectual e, portanto, pessoal.
Contudo, não podemos perder de vista que o contratante da criação do website também tem uma idéia subjetiva do que gostaria que fosse a criação final e que essa criação tem que se aproximar ao máximo da idéia do cliente, posto que é a ele que queremos agradar quando nos propomos a expressá-lo na internet.
Complicado, não? Captar o desejo do outro e ainda expressar o que se tem em mente…
O tema é importante, pois a questão relativa à vontade das partes numa contratação é da máxima importância, já que se trata de elemento essencial do contrato.
Em definição simplista, o contrato é o acordo de vontades tendente a realização de um negócio jurídico. Assim, esse acordo de vontades deve ser bem pontuado e delimitado na redação do contrato.
Mesmo assim, não basta tentar expressar e objetivar essas idéias subjetivas na redação do contrato, como se as palavras pudessem aproximar a idéia subjetiva da criação final. Para que o website saia a contento, é necessário prever de que forma isso acontecerá.
É claro que o contrato será um instrumento importante, mas deve prever as formas de comunicação e de aprovação dessas idéias, visto que dispõe o Código Civil em seu art.112 que ?nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.?
Às vezes, a parte contratada cria algo que não atende as expectativas da parte contratante, senão em termos de funcionalidade, em termos de visualização final do trabalho. E isso torna a relação problemática, senão por uma possível quebra contratual, pela deterioração da imagem de quem realizou a criação. E este não é o objetivo de nenhuma das partes na contratação, não é mesmo?
Pode ocorrer ainda um outro conflito a ser administrado, o da ?síndrome da criação?, em que o profissional se apega à sua criação e não aceita sugestão de modificação em seu trabalho, o que não pode ocorrer em hipótese alguma, visto que se trata da execução da imagem do cliente na web e não apenas de uma ?obra de arte? (embora a lei enquadre a criação de website como criação intelectual).
Um exemplo fictício
Vamos imaginar que exista uma empresa chamada Camisaria Mister Rich, fabricante de camisas sob medida, nos moldes das antigas alfaiatarias, onde as peças são cortadas e costuradas segundo as medidas de cada cliente, com riqueza na confecção.
Com este perfil de negócio, a empresa deseja sua inserção na web buscando se relacionar com seus clientes e ampliar a visualização de seus serviços. Pretende também cativar consumidores mais jovens, com alto poder aquisitivo e acostumados à compra de roupas prontas, mas que buscam algo exclusivo que os destaque.
Ocorre que a agência e/ou profissional contratado para a criação deste website cria algo em tom sóbrio, usando fonte rebuscada e sem uma área de relacionamento com o cliente. Na verdade a Camisaria desejava fugir completamente da idéia de conservadorismo; não desejava um website meramente institucional, mas sim passar a idéia de uma empresa moderna que atende um público exigente mas não necessariamente conservador.
Provavelmente este trabalho irá gerar conflito entre as partes, pois o cliente ficará insatisfeito e o trabalho retornará à agência e/ou webdesigner inúmeras vezes. O retrabalho vai onerar a agência contratada e poderá gerar uma quebra de contrato, na medida em que a criação possui características diversas daquela pretendida pela parte contratante.
Como evitar esse tipo de conflito e diminuir a distância entre essas idéias subjetivas?
Primeiro, adotando postura transparente com o cliente, na elaboração das propostas comerciais, atendendo ao princípios de probidade e boa-fé contratual insertos no art.423 do Código Civil.
Segundo, explicitando em contrato as etapas da criação, atrelando a consecução dessas etapas à aprovação do cliente ou de seus prepostos, devidamente nomeados.
E terceiro, usando extensivamente as possibilidades tecnológicas de relacionamento com seu cliente (uma extranet, por exemplo) para que ele esteja sempre a par da execução dos trabalhos, certificando-se de que seu aval seja dado em todas as etapas conforma acima sugerido.
Subjetividade
Certamente alguns profissionais dirão: mas eu vou desenvolver primeiro o trabalho, para depois saber se o cliente gostou e somente então contratar?
Pelo contrário. Você deve adotar postura transparente desde o início, com contratação inicial por escrito, segundo as regras de direito próprias da relação jurídica. Vai prever o acompanhamento dos trabalhos por meio de tecnologia e descrever as etapas de evolução desse trabalho, cuja aprovação será dada constantemente pelo cliente.
Isso não significa fazer o trabalho para depois contratar. Pelo contrário. O profissional de criação deve vender a seriedade do seu trabalho em um terreno onde se lida com idéias e subjetividade.
A contratação com a descrição detalhada das etapas fará toda a diferença e a imagem da agência e/ou profissional de criação será fortalecida, não havendo desgaste contratual sob alegação de execução em desacordo com o contrato.
Espero ter ajudado a esclarecer um pouco mais sobre como uma boa contratação pode ajudar na realização de um bom negócio. Um abraço e até a próxima edição. [Webinsider]
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Monica W. Rodrigues
Monica W Rodrigues é especialista em Direito do Entretenimento e da Comunicação Social, atua na área do Direito Digital e presta consultoria para agências de criação para Internet.
6 respostas
Olá Mônica, fiquei muito feliz em encontrar este conteúdo, ajudará bastante a todos que como eu anseiam por diretrizes que tornem mais prático e confiável o caráter subjetivo de nosso trabalho. Trabalho com design e comunicação há 10 anos, mas só agora estou realmente me aventurando no território por muitos temido do trabalho autônomo. As vezes encontramos alguma trilha por onde alguém já tenha passado, outrora nós mesmos temos que abrir o caminho a trilhar. Concordo com sua sugestão de apresentar uma forma sistemática do processo de criação. Tenho experimentado incluir nesta diretiva, o uso de referencias por parte do cliente, quantificar quantidade de opções em layout, de revisões, de cronograma para cada etapa, enfim, tornar o cliente consciente de que o produto da criação é o resultado da experiência entre as duas partes, visto que o designer nada faz senão, dar através de suas técnicas, forma ao conteúdo fornecido pelo cliente. O que devo fazer para ter um formato ideal de contrato, redigir um esboço e apresentá-lo a um advogado? obrigado por sua ajuda. Rogério Silveira
Obrigada Djalma,
fico feliz em saber que meus artigos ajudam os profissionais da área.
Dra. Monica W. Rodrigues.
Excelente matéria,
É muito bom saber que existem pensamentos muito parecidos, assim a desmotivação apaga ou volta de veio.
Muito obrigado por essa matéria ajudou muito, conhecer o seu conceito.
Olá Elisa,
recebi seu comentário e gostaria de resposndê-lo.
Realmente vc tem razão, muitas vezes o webdesigner tem outra idéia, ainda mais interessante do que a idéia original no curso do processo.
Nesse ponto nada obsta que vc compartilhe dessa nova idéia com seu cliente, assim como a recíproca em relação ao seu cliente também pode acontecer.
O que vai no contrato não é materialização da idéia subjetiva, mas sim de que maneira vcs vão tratar esse processo de criação, para que o produto final dessa criatividade atenda à expectativa do cliente (ou pelo menos seja o mais fiel possível a essa expectativa), sem que isso signifique para o webdesigenr estar envolvido em um projeto interminável…
Por outro lado, não vejo de que maneira o cliente pode pegar um contrato e pedir pra o sobrinho dele desenvolver o projeto, pelo seguinte: 1º – as partes já se vincularam pelo contrato e não podem quebrá-lo sem alguma sanção; 2º – se seu cliente assinou um contrato com vc é pq acreditou na sua capacidade de atendê-lo e 3º – vc não vai desenvolver o projeto antes de contratar.
Abraço e obrigada por todos os comentários, eles enriquecem meu dia dia.
Dra. Monica W. Rodrigues.
Elisa, essa é uma razão para pela qual eu contesto esse modelo que julga possível pojetar algo a partir de efeitos desejados do projeto. Não concordo que seja possível a criação de alguma coisa que corresponda aos efeitos desejados. A ciência, que é exata, nunca cria uma hipótese que é impossível de ser descartada. Na ciência a hipótese é, na maior parte das vezes, descartada e o precceito substituido e testado denovo. Como o Design, que de exato não tem nada, pode fazer algo a partir de um preceito e no andamento do projeto, vendo que não é possível corresponder ao que se desejava, não pode descarta-lo ou substitui-lo no meio de um projeto?
Excelente artigo! Por muitas vezes já me senti desolada e desmotivada por fatores como estes. Saber que não estou sozinha, e melhor, saber que há soluções para essa distância, é confortante.
Porém, ainda penso que nem todo pensamento subjetivo se enquadre em um contrato. E se o meu cliente ler o contrato, pegar a idéia, e mandar o sobrinho dele fazer sem gastar um tostão?
E para finalizar, o processo criativo nem sempre é instantâneo e acertado. Há muitos casos em que o designer tem um insight dias depois, quando o contrato já está assinado.