Outro dia (na verdade, madrugada) estava conversando pelo Skype com um conhecido que trabalha em comunicação e publicidade na China. No início, contou-me a sobre a curiosidade que tem pelas coisas típicas do Brasil, obviamente, futebol, samba, praia e Gisele Bunchen. Depois, para meu orgulho (apesar de não trabalhar na área), comentou sobre a admiração que tem pela criatividade brasileira, refletida principalmente na propaganda.
Cortando para um outro momento, eu discutia com um empresário chinês sobre os vultuosos investimentos que empresas de internet e tecnologia daquele país estão recebendo, quando ele reclamou que a maioria desses empreendimentos apresentam tremendos avanços tecnológicos, porém, pouca criatividade em termos de negócios e marketing.
Esses são dois momentos que reforçam algo que continuamente martela minha cabeça. Se nós brasileiros somos tão criativos quanto achamos (e os nossos publicitários estão aí para provar), por que temos tão poucos empreendimentos internacionais com diferenciais resultantes da inventividade brasileira?
Além das dificuldades já conhecidas, como economia em desenvolvimento, mercado que permaneceu fechado por muito tempo (acabamos desacostumados a ir ao mercado externo), limitação de crédito, juros, impostos, governo, etc etc etc, é nítida a impressão que não canalizamos totalmente nossa criatividade para a prática de negócios.
Quem quer explorar a capacidade inventiva que aflora na infância acaba usualmente indo para áreas como comunicação e artes. Não que isso seja ruim, pelo contrário, vide o primeiro exemplo acima. O ponto é que poderíamos explorar melhor esse potencial na forma de inovação empreendedora.
Uma área acessível e com enormes possibilidades são de produtos/serviços online (não vou usar o termo web 2.0, mas, é a esses que me refiro). Repercutiu bastante nos blogs de empreendedorismo e capital de risco a declaração de Joe Kraus, fundador do portal Excite, que está cada vez mais barato criar empresas de internet (especialmente no Vale do Silício). O Excite custou US$ 3 milhões na década de 1990 e sua mais última empreitada Jotspot (vendida este mês ao Google) custou US$ 100 mil. Uma boa idéia, mercado, algum capital e muito trabalho para colocar no ar.
Mas qual é a nossa realidade? Temos diversos serviços online – alguns bastante interessantes – mas muitos são basicamente clones de sites estrangeiros (pelo menos três gêmeos do digg.com). Não seria problema se tivessem outros componentes que completassem a oferta, como um modelo de negócios diferente, uma parceria forte, um nicho específico, mas não é o que acontece.
Claro que é cada vez mais difícil ter uma idéia totalmente original. Se ninguém ainda a pôs em prática, é porque talvez seja ruim. Porém, na vida e nos negócios, execução é tudo. Dois produtos complementamente diferentes podem ter se originado a partir da mesmíssima idéia ou necessidade.
Quem desenvolveu os clones brasileiros desses serviços online tem enormes méritos por ter passado da idéia à ação. Porém, isso não é o que pode ser chamado de empreendedorismo. Seus criadores são melhor qualificados como empresários, já que não adicionaram fizeram grandes mudanças ou valor agregado diferenciado. São principalmente executores.
Agora, por que não juntar essas duas pontas (criatividade + execução) em um mesmo empreendimento e criar verdadeiras inovações digitais Made in Brasil? O resultado poderia muito bem ser um serviços online brasileiro, em mandarim, para uma base de mais de 150 milhões de internautas chineses (mesma faixa que os EUA).
Basta perguntar o que teria sido das idéias se o chinês que inventou o papel não tivesse alguém que o produzisse. [Webinsider]
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Obs: por relações familiares, já apresento defesa aos que chamarem os chineses de mão-de-obra barata e pirata. Eles ainda estão esperando alguém pagar pelos royalties do papel, da pólvora, do macarrão etc etc etc.
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12 respostas
Basicamente porque:
atualmente o sistema educativo é extremamente eficiente em fazer três coisas:
1. castrar a criatividade
2. formar empregados
3. formar experts em enrolação (overanalytic people)
mas específicamente no que respeita a tecnologia tem o agravante de que é difícil fazer arte com tecnologia
so que esse problema esta ficando cada dia menor
bem-vindos à Era Conceitual (ver: Daniel Pink’s “A whole new mind”)
Até que ponto a sindrome de vira lata atrapalha a criatividade?
será questão de motivação? eu busco: posses,prazer ou poder? será que é preguicite aguda? talves tudo isso ou nada disso sei la!
Esse email fala sobre várias palestras sobre empeendedorismo no Brasil.
Ooops, esqueci o link do Wiki:
http://netprofit.wikispaces.com/
É um projeto colaborativo e ainda tímido, mas que tem tudo para crescer. =D
Excelente análise, In!
Coloquei um link para seu texto num Wiki que estou montando para documentar e valorizar a internet como mídia, que é o que precisamos para alavancar os negócios nessa área.
Abraço,
Guilherme
http://www.papodehomem.com.br
In Hsieh, Parabéns pelo excelente artigo!
Gostei muito dos pontos destacados pelos amigos que comentaram acima.
Mas vou destacar aqui alguns pontos que achei mais importantes.
1º – citado pelo Luciano Fernandes – Não basta somente ter uma boa idéia, pois pra colocar em prática essa idéia é necessário capital pra iniciar o negócio.
A burocracia enraizada em nossa cultura é muitas vezes um fator crucial na hora de abrir (registrar) um negócio. É ai que muitas vezes um grande projeto toma formas e acaba quase sumindo.
2º – citado pelo Fernando Silva – Porém, acredito haver ainda um componente cultural: muito devido a nossos ancestrais, o brasileiro é criado para ter vergonha de ganhar dinheiro, de ter sucesso e mesmo de ter talento.
Temos vergonha de disputar, bater no peito e dizer que somos emprendedores (ah temos um negócinho…).
3º – citado pelo Fabio – Além das dificuldades citadas pelo luciano, ainda temos que lidar com a mentalidade do brasileiro de levar vantagem em tudo.
Esse é o conhecido jeitinho brasileiro, quanta raiva me faz pensar sobre isso. As vezes queremos abrir um negócio utilizando um investimento 0 e ter 100% de lucro.
Ai fica dificil.
Bom artigo. O que penso é que realmente a criatividade nos sobra, mas em contrapartida o empreendedorismo nos falta.
Dificilmente uma boa idéia criada em uma empresa de garagem se transforme em um negócio altamente lucrativo, pois não temos investidores que apostem nesse tipo de projeto.
Temos no Brasil uma falsa idéia de que o que vem de fora é melhor do que o produzido aqui dentro, e o reflexo disso é visto principalmente no setor de tecnologia.
Podemos considerar o Brasil como um dos principais países em tecnologia de ponta, temos mão de obra especializada para muitos setores, mas praticamente todos os produtos que temos e consumimos(em tecnologia) vem de outros países, tudo o que exportamos e temos explorados são os nossos recursos naturais, sendo que temos muito mais a oferecer e que não são auto-destrutivos como a exploração do meio ambiente.
Muito interessante seu artigo; é um assunto sobre o qual já vinha pensando a algum tempo e discordo em alguns pontos dos comentários anteriores.
Realmente tanto se fala em nossa criatividade e empreendedorismo mas serviço (na internet) usamos hoje e que foi realmente criado no Brasil ?
Temos produtos e serviços muito bons hoje à nossa disposição, mas todos são basicamente cópias de serviços criados lá fora, não temos nada original.
Além das dificuldades citadas pelo luciano, ainda temos que lidar com a mentalidade do brasileiro de levar vantagem em tudo.
Abraços
Parabéns pelo artigo In Hsieh!
Confesso que já me perguntei diversas vezes sobre esses clones brasileiros de projetos de fora. Faltou citar o conhecido technorati também.
O Brasil é um país muito rico em capital intelectual, mas como o colega Luciano disse acima, nossas questões sociais podem atrapalhar um pouco o rumo de nossos desejos. Porém isso não deve servir de justificativa, porque lá fora é possível encontrar projetos grandes que nasceram de pequenas equipes formadas apenas de jovens estudantes de tecnologia.
Nós não estamos muito longe de chegar à um patamar de exportadores de projetos criativos, de qualidade e sobretudo inovadores.
Acho que nos falta, apenas, perder um pouco do medo do novo e fazer acontecer, porque potencial, temos de sobra! 😉
Muito bom, In. Certamente as questões pragmáticas como juros e burocracia atrapalham demais. O Brasil também carece de um projeto nacional baseado em investimento em educação, infra-estrutura e estímulo a pesquisa e desenvovimento e ao risco empreendedor.
Porém, acredito haver ainda um componente cultural: muito devido a nossos ancestrais, o brasileiro é criado para ter vergonha de ganhar dinheiro, de ter sucesso e mesmo de ter talento.
Um CEO de uma gigante internacional da publicidade uma vez comentou sobre nós: vocês são muito, muito bons, só lhes falta auto-confiança. Isto também é verdade.
E aquela famosa mania de querer improvisar tudo – até mesmo o que pode ser planejado? Isto eu nunca consegui entender…
Apesar de tudo isto, mantenho a fé em nosso potencial 😉
O artigo toca num ponto crucial, e acredito que o brasileiro tem sim muita criatividade.
Contudo devo dizer que as vezes a criatividade esbarra em alguns problemas.
Não basta somente ter uma boa idéia, pois pra colocar em prática essa idéia é necessário capital pra iniciar o negócio.
Os bancos cobram taxas absurdas pra empréstimos pra micro empresas.
Quem tem dinheiro prefere investir em empresas já consolidadas.
Quem tem idéias boas, nem sempre possui conhecimento administrativo pra empreender um negócio próprio.
A idéia boa termina ou por não se concretizar, ou demora tanto pra ser implementada por causa da burocracia que acaba não sendo mais uma idéia nova.