Todos que assistiram o clássico filme “Quero ser grande”, de 1988 (cof! cof!) já sonharam em poder brincar em um piano gigante de chão. O quanto não fiquei #chatiado então ao saber que a FAO Schwarz (hoje pertencente à rede Toys’R’US), a icônica loja de brinquedos localizada na 5a Avenida, em Nova Iorque, fechará suas portas em 2015.
Embora comunique ao mercado que busca um novo endereço em Manhattan para esta loja conceito, o acontecimento traz à tona uma interessante discussão sobre a relação deste tipo de produto – brinquedos – com o público infantil.
Não é segredo que o mercado de brinquedos vem se virando nos 30 para sustentar o interesse dos pequenos da geração alfa, beta, gama (já perdi a conta) naquelas caixinhas, personagens e coisinhas de encaixar em um mundo cada vez menos tangível, ou melhor, cada vez menos analógico.
Embora a Lego coloque o Brasil como 7o. maior mercado de brinquedos do mundo, nos últimos anos esse mercado vem crescendo cada vez menos (12% em 2013, 5% em 2014, segundo a GFK). A troca do presidente da Mattel no início de 2015, em função da baixa performance de seus produtos, também reforçou a percepção de que algo precisa ser feito, e rápido!
Não vemos apenas mudanças na expectativa dos pequenos quanto às projeções e aspirações feitas em seus personagens e brinquedos preferidos em geral, mas a fortíssimas competição com outras formas de entretenimento, como consoles de videogame, tablets e, resumidamente, uma série de outras telas.
A indústria de brinquedos ‘offline’ vem tentando há algum tempo trazer para seus dispositivos físicos o mesmo glamour dos conectados, incorporando funcionalidades que integram seus brinquedos ao ambiente virtual, alguns com, outros sem sucesso.
Mesmo a clássica Barbie – esta senhora de 56 anos – rendeu-se a esta nova realidade. A Hello Barbie que, segundo o New York Times (e diversas outras publicações), deve chegar ao mercado ainda este ano, é uma boneca que incorpora um sistema de conversa que permite estabelecer um diálogo com a criança, no melhor estilo “Siri” e “Cortana”, já bem conhecidas por donos de smartphones.
E, apesar dos protestos pelo fato das conversas trafegarem pela internet e para sistemas de ToyTalk, empresa parceira nesta iniciativa, o que poderia implicar em sérios riscos de privacidade para as crianças, é um exemplo interessante de como responder à pergunta: “Legal esse brinquedo, mas o que ele faz?”.
Argumentos pró e contra
Por um lado, muitos argumentam que os brinquedos “de antigamente” tem como principal atrativo o uso da imaginação e da imersão em narrativas criadas pela própria criança, próprios do mundo infantil; ou seja, o brinquedo faz o que você quiser que ele faça, desde que seja na sua imaginação.
Outros argumentam que o entretenimento eletrônico, ao ativar de maneira intensa os sentidos humanos e o senso de comunidade, traz um apelo muito mais forte a este público criado à base de muito touch e múltiplas telas.
Empresas tipicamente digitais, por sua vez, enfrentam consequências da cauda longa ao competirem quase de igual para igual com centenas, milhares de publishers espalhados pelo mundo, tentando conseguir seus downloads de fama para gerar uma receita considerável a partir de microtransações e deixando os 30% do lojista (a.k.a. Google, Apple, Microsoft para mobile) ou qualquer corte preterido pelo detentor do canal de distribuição.
Juntamos, assim, a fome à vontade de comer. Fabricantes de brinquedos que não fazem nada com desenvolvedores de funcionalidades que precisam aumentar o número de recipientes para distribuir este conteúdo digital. E esta união pode se dar a partir de um lado ou de outro.
Não existe mas on e offline
No caminho digital -> físico, um bom exemplo são os jogos chamados TTL (Toy-to-Live) onde, entre os exemplos, podem ser encontrados o Skylanders, da Activision, o Disney Infinity e o Amiibo, da Nintendo. Os componentes físicos (personagens), além da relação com a experiência do game, também têm um apelo colecionável inerente.
No caminho inverso, as fábricas acostumadas a moldes de produtos físicos correm atrás de possibilitadores (o termo em português é bem estranho, entenda como ‘enablers’) que incorporem de maneira realmente integrada as duas abordagens, e não apenas “criem o aplicativo do brinquedo” que em nada se relaciona, na prática, com aquela coisa que veio em uma caixa, além de compartilharem o mesmo personagem e/ou elemento visual.
Grosso modo, não estamos falando do “joguinho online do personagem x” (que também tem um brinquedo físico), nem das “figurinhas colecionáveis daquele jogo de videogame”.
Não estamos falando de experiências isoladas em seu mundo on e offline; não existe mais on e offline, tudo é uma coisa só, o real e o digital se convergem para que, no final, a experiência lúdica do entretenimento infantil possa explorar ao máximo o potencial de cada meio, ao mesmo tempo. [Webinsider]
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JC Rodrigues
JC Rodrigues (@jcrodrigues) é publicitário pela ESPM, pós-graduado pela UFRJ, MBA pela ESPM. Foi professor da ESPM, da Miami Ad School e diretor da Disney Interactive, na The Walt Disney Company.
Uma resposta
Olá Rodrigues, tranquilo?
então não tinha parado para analisar isso na verdade nem tinha me dado conta, eu brinquei a infância inteira com lego e devo a isso (eu acho) minha mente programadora porém é um fato que vejo com meus filhos.
Brinquedos? tu enrola até os 3 ou 4 anos agora, O mais sensacional foi ensinar meu filho do meio a usar o PC, já saiu clicando na tela… mouse?? vai ficar para trás também, coisa bem natural, ele sabia que tinha que acionar os ícones mas apertando na tela, no nosso tempo as coisas não eram substituídas da noite pro dia né?
se eu fosse presidente desses grupos não pensaria duas vezes em construir sistemas online para crianças.
Excelente artigo, um abraço!