Eu tenho plena convicção, ao longo desses anos todos, de que o ideal para a montagem de um home theater é que a sala seja feita para ele e não o contrário. Mas, a realidade da maioria de todos nós é justamente este inverso, nos forçando a fazer as modificações que forem necessárias para que o sistema instalado funcione a contento, tudo em uma sala que nunca foi destinada para esta finalidade.
E por sorte a instalação padrão de qualquer formato de áudio tem tolerâncias as mais diversas e/ou inesperadas, caso contrário estaríamos todos lascados ou perdidos em um limbo de dúvidas.
Veja a ilustração a seguir, fornecida no manual de um A/V receiver de boa reputação:
Ela se refere a um ambiente onde não existem dificuldades de instalação de caixas acústicas, com as devidas tolerâncias de angulação. Note que a posição sugerida do ouvinte está aproximadamente um pouco atrás do meio da sala. Em épocas remotas eu enfrentei este dilema, pois no meio da minha sala não era possível colocar um sofá, e sim na parede oposta à TV. Na época, eu precisava instalar um par de caixas Surround Back. Recorrendo ao suporte da Dolby o técnico sugeriu instalar as caixas na parede atrás do sofá com uma angulação adequada, voltada para o centro da sala. Deu certo! Mas, não é o correto, porque as caixas deste tipo devem ficar atrás e não em cima de quem está sentado ouvindo.
Ora, se a sala fosse a ideal, em primeiro lugar eu jamais instalaria o sistema no sentido da largura e sim do comprimento. Neste último a dispersão do som é infinitamente superior e exige o mínimo de esforço na instalação de qualquer caixa. No sentido do comprimento o palco sonoro frontal é uniforme sem a necessidade de angular as caixas esquerda e direita, por exemplo.
Se a instalação for ortodoxa, a opção de usar a largura e não o comprimento estaria descartada! Então, o que fazer diante deste impasse? Usar a criatividade!
Os ângulos descritos na figura acima são os recomendados, mas isso não quer dizer que eles sejam necessariamente rígidos. Na realidade, é possível notar uma faixa de angulação no lugar de um ângulo fixo. E isto em parte é devido ao fato singular de que cada tipo de caixa acústica tem suas próprias características de dispersão, seja vertical ou horizontal. A dispersão da caixa depende do projeto e dos alto-falantes que são usados na sua construção. E por isso os resultados acústicos são variáveis.
Instalações no sentido da largura podem ter deficiências de angulação das caixas frontais esquerda e direita compensadas pela simples modificação do ângulo, de tal forma que no final elas apontem para o local de referência do ouvinte. E no caso específico dos home theaters, fazendo um pequeno arco com a caixa central.
Os pontos de dúvida
Existem locais de um home theater onde a instalação de caixas não consegue ser idêntica à do cinema. Um desses pontos é o do canal central. Nas instalações feitas com o uso de um projetor e com tela acusticamente transparente o problema está resolvido, mas com uma tela de TV a coisa muda radicalmente de figura, porque a TV bloqueia a emissão de som de uma caixa instalada atrás.
A solução é posicionar em cima ou em baixo da TV, que é o que todo mundo faz. Mas, a que altura? Se este obstáculo não fosse previsto no ajuste dos decodificadores não seria possível fazer isso, mas o fato é que quando se mede a distância e o nível da pressão sonora, o computador de bordo compensa em parte esta diferença. E por isso os técnicos de suporte costumam orientar a colocação de caixas abaixo ou cima da TV indicando uma determinada tolerância de altura.
Para a instalação das caixas surround o padrão é 2/3 ou 3/4 da altura total da parede, o que for mais viável. Mas, nada impede que o usuário as coloque um pouco acima dos níveis dos seus ouvidos, no ponto de referência (“sweet spot”) da sala. Na minha avaliação pessoal os melhores resultados de dispersão são aqueles conseguidos colocando-se as caixas surround mais acima dos ouvidos, como indicado no padrão de altura citado acima, e tanto faz se ligeiramente à frente ou para trás em relação aos ouvidos. Caixas surround bipolares, por exemplo, eliminam qualquer discrepância deste tipo.
O layout padrão do Atmos modificado
A instalação do Dolby Atmos, ao contrário do Auro-3D, sugere variações de layout, mas simultaneamente coloca dúvidas às quais o usuário inexperiente terá que enfrentar.
A primeira dúvida é sobre a eficiência das caixas chamadas de Dolby Enabled, do tipo “up-firing”, isto é que direcionam o som para o teto, de forma a que ele seja refletido de volta ao ouvinte. Tal processo, amparado no princípio HRTF (Head Related Transfer Function), invoca elogios, mas invoca dúvidas sobre a sua eficiência. Tudo isso porque a reflexão de sons no teto só é acusticamente possível quando a emissão está na faixa entre 7 a 12 kHz, ou 7 a 8 kHz mais realisticamente.
Fabricantes de caixas Enabled as projetam para cortes de 150 Hz para cima, aos quais o usuário que as instala é obrigado a fazer. E alguns modificam a curva de resposta de frequência do sonofletor para dar um reforço de amplitude entre 7 e 12 kHz na rede passiva divisora da caixa, a meu ver um design inútil e capaz de introduzir distorção, o que deve ser evitado.
Na minha experiência as caixas Enabled “up-firing” funcionam, mas o efeito final, uma vez comparado ao de outros layouts alternativos, deixa muito a desejar. Além disso, um detalhe que me levou a abandonar este tipo de layout foi o fato do Dolby Atmos ser desenhado com canais “full range”, isto é com ampla gama de resposta de frequência, que estaria desperdiçada refletindo-se o som no teto sem a certeza dele chegar ao destino. E, de fato, bastou mudar o layout para Height frontal e a qualidade do som Atmos começou a mudar como um todo, e sem deixar margem para dúvidas deste tipo.
Sobre as caixas no teto, talvez o padrão ideal para o som 3D, a posição das caixas não é consenso, e mais uma vez é a sala do ouvinte que determina a melhor posição de cada uma delas. Como o Atmos admite frente, meio e traseira, a posição do assento de referência pode e a meu ver deve seguir de guia. Como os resultados variam, o ideal seria que as caixas do teto pudessem ser movidas até se conseguir a dispersão ideal. Se isto não for possível, a alternativa seria experimentar instalar caixas na frente e na traseira, caso o assento esteja um pouco atrás do meio da sala, ou na frente e no meio se o assento estiver próximo à parede de trás.
Modificações importantes para as caixas Height
Como já previamente comentado aqui na coluna, Dolby e Auro-3D compartilham a ideia de instalar caixas na parte superior das paredes, mas com variações de posição.
Em ambos os casos, a instalação de caixas Height (ou Superiores) na parede frontal deixa pouca margem de dúvida, porque basta que eles fiquem em uma altura que as permite serem anguladas na posição certa, apontando para o ponto de assento do ouvinte e geralmente no topo da parede, como mostrado na figura acima.
Na instalação do Atmos, as caixas Height traseiras ficariam na mesmíssima posição, próximas ao teto, mas com a posição do assento na parte posterior da sala, a angulação necessária ficaria praticamente impossível.
Aqui é preciso notar que o som 3D se baseia na ilusão acústica da reprodução de sons acima do nível dos ouvidos, o que, aliás, é conseguido em parte pelas caixas surround convencionais. Na camada superior de reprodução, a dispersão mais próxima do ideal seria conseguida pela emissão de informação sonora derivada das caixas instaladas bem acima do nível do ouvido, formando um campo auditivo que preenche o restante da sala.
Note que não é necessário que o som 3D seja emitido por caixas instaladas no teto, tanto assim que o Auro-3D coloca o canal chamado “Voice of God” como opcional. O Auro depende de quatro caixas Height para funcionar corretamente, o que não é nem um pouco diferente, neste caso, do Dolby Atmos.
No Atmos, quatro caixas Height dão a informação sonora necessária aos ouvidos, uma vez posicionadas acima e apontadas de cima para baixo. Como na parte da frente isto não representa problema, fica a dúvida para a parte de trás, caso o ouvinte esteja próximo da parede traseira.
Ainda sem uma solução convincente e uma vez recorrendo ao suporte do fabricante do meu equipamento, o instalador sugeriu uma fórmula a qual eu mesmo já tinha pensado: instalar as caixas lateralmente, inclinadas para baixo e apontando para o local de audição ou ligeiramente à frente do mesmo.
Para se conseguir isso é preciso recorrer a um suporte que permita virar a caixa lateralmente e depois dar um giro na caixa em torno do seu eixo:
Existem suportes no comércio, fabricados por Elegê Pedestais e Suportes Multivisão, que poderiam ser usados para se conseguir o giro necessário, mas infelizmente sem a firmeza necessária. Eu testei o segundo deles com uma caixa BSA AW-6, cujo peso (2.3 kg) está abaixo do que o suporte declaradamente aguenta (3.0 kg), mas sem nenhum sucesso. O adaptador se encaixa firmemente no baffle, mas a montagem na parede deixa a caixa balançando, mesmo retirando a extensão, o que é péssimo para o resultado acústico.
A BSA AW-6 vem de fábrica com suporte próprio, como poderá ser visto nas ilustrações acima. Embora o furo central seja destinado à passagem de fiação, nada impede que ele seja usado para fixar a caixa na parede, bastando usar uma bucha mais parruda (eu usei uma de 10) e um parafuso compatível, com cabeça sextavada, de modo a facilitar o ajuste. De posse de uma chave de boca 10/11 se prende a caixa parcialmente, depois se vira o conjunto e se faz a fixação final. O suporte da caixa permite o giro lateral, que permite aponta-la para o local certo com a necessária precisão. Eu fiz esta instalação em uma altura de 3/4 da parede por conveniência minha. Não há necessidade de se instalar caixas Height deste jeito no topo da parede.
Resultados e comentários
O campo sonoro superior obtido com quatro caixas do tipo Height formando um quadrafônico elevado é bastante mais eficiente no espalhamento vertical e horizontal pretendido na reprodução do som 3D.
Um dos objetivos do Dolby Atmos e presumivelmente do DTS:X (MDA), que trabalha nos mesmos princípios, é o permitir ao engenheiro de mixagem a liberdade de colocar o som ou efeito sonoplástico em qualquer posição do espaço, seja ele superior ou inferior, e sem as restrições impostas pelo layout 2D convencional.
A interação entre as caixas acústicas superiores e aquelas instaladas no leito (5.1 ou 7.1) permite que tal deslocamento aconteça. A experiência com quatro caixas na parte de cima da sala ao invés de duas me mostra e confirma que o aumento do número de caixas Height na parte superior da parede melhora consideravelmente a reprodução 3D.
Entretanto, o que eu tenho observado é o caos que resulta das mixagens de alguns dos filmes produzidos recentemente, independente do som ser 2D ou 3D. E isto dificulta sobremaneira a apreciação da trilha sonora como um todo, tornando a audição cansativa, ao ponto de exaustão.
Cineastas e engenheiros precisam tornar prevalente a qualidade do roteiro ao invés de efeitos fotográficos ou sonoros. Este é o princípio pelo qual o cinema foi criado e desenvolvido. O cinema mudo nos mostrou que até mesmo em silêncio é possível criar suspense. E não sem motivo, porque o cinema se fundamenta na força do impacto visual da imagem fotografada. E o som tem o papel de aprimorar esta experiência, não de deturpá-la!
Sob o ponto de vista da aceitação e da instalação, a meu ver o grande percalço dos sistemas 3D continua sendo o aumento das despesas envolvidas e os transtornos decorrentes da inclusão de mais caixas no ambiente.
Um sistema 3D completo envolve uma amplificação de 11 canais, embora não seja obrigatório que assim se faça. O custo é alto e poderá não estimular aqueles que não estão envolvidos no hobby ou que não se importam tanto assim com efeitos sonoplásticos das trilhas sonoras.
Além disso, sem referências de reprodução ou ajuda de quem faz o design dos codecs fica mais difícil tratar a instalação com menos experimentação e avaliação de resultados. No meu caso, algumas etapas ainda restam ser vencidas, e isso me remete de volta à década de 1990, onde poucos cinemas tinham som digital 5.1 e os manuais de receiver com este formato eram crípticos.
Se o som 3D, apesar dos avanços conseguidos, se tornar um nicho depois de algum tempo, eu sou um que não ficará surpreso. [Webinsider]
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.
4 respostas
Boa tarde Paulo, tudo bem?
Melhor artigo que consegui ler até o momento.
O meu caso é uma sala que o sofá fica na parede, ou seja meu surrond esta ao lado com pedestres, caixas bookshell JBl arena 120. ” não é o indicado que vejo lendo mas é o que consigo”
Tenho as três da frente Central JBL 125C e as duas Bookshelf Aren 120.
A pergunta que gostaria de sua orientação é posso colocar 2 caixas high front no teto para simular o Dolby atmos?
E qual a distancia da parede que estão em cima das caixas da frente no teto de gesso eu devo colocar?
Eu sei q é tudo ajustável, mas gostaria de uma orientação.
E principalmente, se vale a pena colocar somente mais 2 caixas no teto e na frente para simular o Dolby?
Meu Denon é s720w e somente suporta mais duas caixas ACHO…
Obrigado
Bom dia Paulo, gostei da sua explicação que me tirou algumas dúvidas quanto a geometria das configurações. Vi que tem outros artigos, porém ao tentar acessá-los a página dá erro. Queria saber mais a respeito da matéria dos novos decoders DTS:x e DTS Neural:X.
Paulo, bom dia.
Com relação a instalação caixas em um sistema dolby atmos, seguindo sua sugestão em outra matéria, poderia usar uma instalação 5.1.4.
Utilizando um receiver 9.2, se adotar sua sugestão das caixas height, 2 frontais e duas traseiras, sobraria espaço para as caixas convencionais frontais e mais 2 surround.
Minhas perguntas são:
Posso instalar as caixas height no teto?
Quanto as caixas surround, posso instalá-las também no teto, no caso um pouco a frente das height e lateralmente em relação as height?
Obrigado.
Olá, Ricardo,
Você pode instalar as caixas Height no teto, modificando o layout no setup do receiver, para evitar a dispersão errada da trilha Atmos.
Na minha opinião instalar caixas surround no teto é um erro, porque a mixagem leva em consideração a altura nas paredes mais próximas do ouvinte e jamais no teto. Além disso, todos os codecs 3D sem exceção pressupõem a existência de caixas no plano inferior (5.1, 6.1 ou 7.1), portanto as caixas surround e surround back tem que ser instaladas na parte de baixo da sala.