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Anatel e a internet limitada

Senta que lá vem textão… =)

Gritos de desespero, mensagens inflamadas e revoltadas tomaram conta da xôxo media (e da ‘mídia tradicional’) nas últimas semanas com a possível (inerente?) alteração na forma como o acesso à internet no Brasil é cobrado pelas operadoras de banda larga.

Para quem esteve em uma caverna isolada no Afeganistão ausente nos últimos dias, acompanhamos a vivacidade (entendeu o trocadilho? ahn? ahn? ahn? =P) do presidente da maior operadora de telefonia e internet do país em emplacar junto à Anatel o sistema de “franquia de dados”, existente no acesso mobile, também no acesso residencial.

Fazendo breve uma longa história, você teria um “limite de dados” para usar a internet por mês. Acabou o pacote, sua velocidade seria reduzida. Você seria obrigado a comprar um pacote adicional de dados ou ficar offline até o mês seguinte (Oi?).

Para saciar a curiosidade, estes eram os planos pretendidos:

 

Planos das operadoras para a internet limitada

 

Para referência, a partir de uma reportagem apresentada no Fantástico, uma família de 4 pessoas utilizando 4 horas de internet diária em distintas atividades chega a consumir 1Tb/mês, dez vezes mais do que a franquia média que seria oferecida pela Vivo.

Ou seja, caso este modelo seja implementado, esta família poderá pagar até dez vezes mais por mês no serviço, ou, como “opção”, cortar seu consumo de internet para um décimo do atual.

 

Anatel se explica

 

Com a anuência do presidente da Anatel, o argumento das operadoras que embarcaram neste lobby é que existe o consumo excessivo de dados (em serviços de vídeo e, para o presidente da Anatel, em games online) que prejudica a qualidade do tráfego, tendo como pano de fundo a regra já existente no acesso mobile (3G/4G) e a existência deste tipo de limitação em outros países (por exemplo, nos EUA há um ‘data cap’, ou seja, um limite na quantidade de dados que podem ser transmitidos num mês dentro da franquia de internet contratada).

Essa também é uma manobra ‘marota’ após a implementação do Marco Civil na Internet e a neutralidade da rede.

Calma, jovem, senta aqui, vamos entender um pouco a situação…

Primeiramente vale dizer que os dados de internet não são um bem findável. Diferentemente da água ou da energia elétrica, a produção destes dados não gera custo de produção a quem os distribui.

Porém, do ponto de vista justamente da distribuição, o impacto direto num aumento do consumo de dados é o afunilamento de sua entrega. Usando uma analogia, se aumentarmos o fluxo (ou demanda) de água sem aumentar o diâmetro do cano, a quantidade de água distribuída atingirá seu limite (ou seja, não será possível aumentar a quantidade de água entregue pois não há como passar mais pelo cano). Este é o real impacto de um citado aumento no consumo de dados.

Adicionalmente, e como sempre, no caso do nosso país o buraco é mais embaixo. Ao apontarem o aumento no consumo de vídeo online (Netflix, YouTube, etc) como culpado pelo incremento do tráfego, na verdade estão tentando impedir um movimento já iniciado nos EUA: o cancelamento dos planos de TV a cabo por conta do VOD (Video-On-Demand).

Olha que coincidência, as mesmas empresas que distribuem internet também são operadoras de TV a cabo (com planos mais rentáveis).

É como se o Departamento de Estradas de Rodagem proibisse carros elétricos de circularem nas rodovias (mesmo pagando os mesmos pedágios) porque isso impacta a venda de combustível pela Petrobras.

Mercado aberto, pero no mucho…

É necessário dizer que o Brasil não possui livre-mercado em boa parte de seus serviços à população, mas sim monopólios (privados ou estatais) OU mercados regulados pelo Estado; e isso faz uma diferença enorme na comparação de nossa República das Bananas com outras nações do globo.

Grosso modo, este modelo significa que que não basta ‘querer’ (e ter capital para) abrir uma empresa em determinados setores, o governo tem que “deixar” você fazer isso.

Na cidade de São Paulo quem opera a infraestrutura elétrica é a Eletropaulo, quem opera a distribuição de gás é a Comgás; no Brasil, quem opera a distribuição de mídia de rádio e televisão são a Globo, SBT, Jovem Pan, Mix FM, Band, etc (que operam em modelo de “concessão” governamental, quer dizer, só podem funcionar “porque o governo deixa”). E quem opera a distribuição de serviços de internet são as operadoras (Vivo, Tim, Net, Oi, etc).

Quando um mercado é limitado, por regulações governamentais ou intransponíveis barreiras de entrada (como alto custo para infraestrutura inicial devido à carga tributária, por exemplo), o principal benefício de uma economia de mercado verdadeira (a competição) desaparece, e passamos a ter um monopólio autocrático ou um oligopólio mancomunado.

Carga tributária sobre serviços de banda larga

 

Quando menor a concorrência, menor a competição, logo, maiores os preços e pior a qualidade.

Seguindo as comparações: se muita gente entra em um restaurante e a cozinha e os garçons não têm capacidade de atender a todos que ali esperam, é natural que este esfomeado cliente busque outro local para se alimentar.

Para o restaurante, ou ele aumenta a capacidade de atendimento (entrega) ou aceita que atingiu seu limite naquele momento e divide o mercado com as demais opções.

Imagine uma situação onde um rodízio japonês, ao receber um fluxo maior de clientes, determine que agora os que estão ali não poderão pedir mais sashimis (a não ser que paguem mais), pois agora é preciso economizar peixe para servir para mais pessoas. Não faz sentido, Claro!

“Ah, mas pera aê! E se não for ‘rodízio’?”, significando, “e se as pessoas que ali estão pagam pelo consumo? Se quiserem mais sashimis, paguem outra porção!”.

Pois bem, aí vem um questionamento sobre o modelo comercial aplicado.

Então vamos falar de valor, preço e modelos de negócios:

Como premissa, “valor” e “preço” não possuem necessariamente uma relação matemática imutável. É dizer, não é porque a produção de um produto “custa” $ 10 à empresa que seu preço de venda ‘deva’ ser, por exemplo $ 12. Ele poderá ser $ 11, $ 15, $ 100 (tipo assim um iPhone..).

A percepção de valor (derivada de inúmeras variáveis, como qualidade, disponibilidade, percepção de marca, serviços agregados etc) é o que determina se aqueles $ 10 viram $ 12 ou $ 100.

Também existem diversos modelos transacionais no mundo, do medieval escambo (ovelha por vinho) ao real-time-bidding (preço variável); em todos eles, porém, há uma relação natural e histórica entre preço e quantidade.

Ou seja, sendo cartesiano, “x” vale “y”, “2x” valeriam “2y”. Claro que, em um ambiente de competição saudável, um vendedor pode comprometer a margem unitária para estimular um maior consumo (“x” vale “y”, mas “se você comprar 2x” custam “1,5y”).

Bom, isso serve apenas para tentar entender qual é o modelo aplicado aos serviços públicos, onde encaixam-se aí a energia elétrica, água e gás encanado e, por quê não considerar, a distribuição da internet.

Levemos o restaurante a quilo para este universo. Se as operadoras de internet (e a Antatel) defendem cobrança adicional para um maior consumo, isto significa que eu pagarei menos quando tiver menor consumo?

Estou sendo cobrado de forma variável em função do meu consumo ou estão apenas querendo vender uma experiência ilimitada contraditoriamente atrelada a limites?

A propósito, terei 100% da velocidade contratada ao invés dos “rigorosos” 40% permitidos pela Anatel?

Dois modelos comerciais protagonizam a migração das transações: cada vez mais a ‘posse’ (aquisição de um bem, com depreciação ao longo do tempo e custo de manutenção) perde espaço para o ‘uso’ (utilização sob demanda de um bem – ou serviço). Venda seu carro e use carsharing ou pay-per-use; deixe de pagar diárias de hotel e fracione a estadia (HotelQuando.com).

Neste segundo modelo, por sua vez, o uso é feito através de pagamento recorrente para acesso ilimitado – incluindo modelos freemium – como Netflix, Spotify, XBox Live ou pagamento em função do consumo – incluindo microtransações – como energia elétrica, combustível, água, gás.

Os serviços digitais parecem ter encontrado a fórmula (inclusive financeira) para preferir a primeira opção, atribuindo valor exatamente pela ampla possibilidade de uso (“pago o Spotify porque posso ouvir quantas músicas quiser, quando quiser, sem ter que me preocupar em organizá-las”, do contrário teria que comprar individualmente no iTunes ou baixar via torrent).

anatel quer que a gente brinque de aquaplayEsta discussão sobre limitar o consumo de internet acaba não sendo nem uma coisa, nem outra. É buffet livre até um limite, mas tem consumação mínima no preço a quilo.

Limitar o consumo de um bem infindável pela não necessidade de tornar-se mais competitivo graças à baixa (e controlada) concorrência significa penalizar o potencial que a conectividade oferece e todos os negócios ali ‘plugados’.

E, culpar os ‘games’ por isso é coisa de gente que não teve um Aquaplay…

[Webinsider]

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Leia também:

http://br74.teste.website/~webins22/2016/04/01/desafio-desenvolver-conteudo-de-qualidade-constantemente/

Avatar de JC Rodrigues

JC Rodrigues (@jcrodrigues) é publicitário pela ESPM, pós-graduado pela UFRJ, MBA pela ESPM. Foi professor da ESPM, da Miami Ad School e diretor da Disney Interactive, na The Walt Disney Company.

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