Roqueiros do passado distante se distinguiram em suas apresentações ao vivo com métodos e técnicas teatrais e isso foi a mais provável forma de vender a música que gravavam nos estúdios.
Na década de 1950 em diante, futuros grandes astros do Rock & Roll fizeram de tudo para vender discos. Para tanto, perceberam que o fator divulgação era de crucial importância, no rádio e em particular nas apresentações ao vivo.
O Rock & Roll, como o nome sugere, é um tipo de música agitada por natureza. Vários artistas do Rock perceberam que bastava um pouco de mise-en-scène ou teatralização nos palcos junto com a música, para agitar o ambiente.
Três dos mais proeminentes artistas do Rock da época se destacaram consideravelmente dos seus pares neste particular: Elvis Presley, é claro, Jerry Lee Lewis, e o The Big Bopper, falecido prematuramente em um desastre de avião.
A expressão corporal, que é uma das técnicas que o ator de teatro aprende e tem que dominar, foi amplamente assimilada por esses artistas, levando a uma excitação natural para a plateia de jovens que frequentavam este tipo de concerto. A juventude da plateia se tornou o fator determinante do sucesso das apresentações, porque os adolescentes estão no pico das suas sexualidades! E é justamente na expulsão aumentada de hormônios no plasma dos mais jovens que a sintonia entre música e ritmo agitado ocorre com muito mais facilidade.
Quem está no palco e já ensaiou o que vai fazer pode facilmente perceber a reação da plateia. Quando positiva, o sincronismo entre música e público atinge então o seu objetivo, que é o da aceitação do que é tocado ou cantado.
Elvis Presley
A sensualidade da expressão corporal de Elvis Presley nos palcos, seus trejeitos, o balançar das pernas e a maneira como ele se vestia, fizeram um enorme sucesso, ao mesmo tempo em que foram desencadeadas críticas da sociedade americana conservadora.
Elvis foi, sem dúvida, o epítome da sensualidade do Rock & Roll, a sua música nem precisava ter duplo sentido, bastava a agitação do ritmo. Ele também foi muito ajudado pelo seu tom de voz natural, insinuante e sugestivo, capaz, desta forma, de deixar o público feminino cheio de sonhos e desejos.
Jerry Lee Lewis
Jerry Lee é um caso à parte. A sua agitação no palco não tem paralelos. Em uma das suas apresentações, ao tocar “Great Balls of Fire” ele tacou fogo no piano! E a cena está mostrada no filme do mesmo nome, com o ator Dennis Quaid:
Jerry Lee foi a personalidade controvertida em pessoa, e não tinha, aparentemente, medo de enfrentar os seus detratores. No palco, ele encarnava o personagem rebelde:
Na vida pessoal, despertou críticas da sociedade moralista quando se casou com Myra Gale Brown, sua prima de 13 anos. Chegou a ver seu prestígio declinando em curto espaço de tempo, por causa disso. As suas músicas de sucesso contribuíram também para as críticas que pesaram sobre ele. Quando interpretou Great Balls of Fire, a letra traz consigo um duplo sentido escancarado.
Mas, o lado agitado do artista nos palcos, cada vez mais louco e imprevisível fez a sua carreira se manter estável. Ganhou vários prêmios Grammy e fez parte do Hall da Fama.
The Big Bopper
J. P. Richardson adotou o nome de palco como The Big Bopper. A palavra “bop” é difícil de traduzir, por causa dos seus múltiplos sentidos, e é bem provável aqui se tratar da figura de alguém que frequenta festas ou casas noturnas.
Coma icônica música Chantilly Lace, ele gravou para a Mercury seu disco de maior sucesso:
O estardalhaço das suas interpretações é melhor notado na maneira como ele gravou suas músicas. Basta ouvir Chantilly Lace, e observar a adulteração do tom de voz e a quase paródia da interpretação. E aqui novamente o duplo sentido da letra toma conta, e sugere que o personagem está a fim de muito mais do que só olhar o penteado do cabelo da namorada!
O legado dos roqueiros
Toda vez que uma cantora jovem apela, se apresentando no palco com roupas sumárias, coreografia exótica, etc., é fácil prever que ela está ali para vender a sua música. E esta observação se estende a todo o tipo de música e artistas que vão para o palco.
Eu já me diverti ouvindo do pessoal que compõe ou se apresenta em shows, ou simplesmente é crítico, como o crítico musical, observações sobre a coisa chula no lugar da música. Mas, esta é a maneira mais “fácil”, digamos assim, de vender a música como um produto para consumo de massa.
O marketing do escândalo não é novidade, ele está presente na mídia todo santo dia. Os shows de Rock passaram a ser pirotécnicos, portanto a antiga mise-em-scène continua lá. Quando alguém que gosta somente de música quer assistir a música ao vivo, o objetivo de ir a este tipo de show perde o seu apelo. Para o consumo de massa, é justamente o contrário.
Em suma, a antiga receita dos roqueiros, de setenta anos atrás, continua tendo os seus seguidores. Com a ausência dos grandes estúdios no mercado, o jeito é arrumar formas promocionais alternativas, e provavelmente por conta própria. Outrolado_
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.