O “cool” errado

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Agora é assim: todo mundo só quer saber dessa coisa. O “cool” é o que há. É hype ser cool. É tudo.

E por conta dessa “tendência” – outra palavra que é o ó – pipocam em todas as apresentações, todas as falas, todas as atitudes, esse falso apóstolo: o “cool”.

Na carona dessa bobageira, porque somos todos macacos, nasceu esse negócio novo chamado de cool hunting ou seja, caça ao cool. Relatórios gigantescos, caros, pretensamente proféticos, anunciam o que vai pegar no mundo. Dizem que tem até gente usando cool no nome!

Outro dia eu soube de causos lindos.

Uns bacanas almoçavam numa esquina dourada, travestidos com suas próteses griffadas e seus relógios cools. Só que os referidos marcadores eram falsos, mas noblesse oblige. O mundo é perigoso demais, então o Stand Center é quase uma Daslu. Pois foram assaltados e regurgitaram de prazer ao anunciar em uníssono que o Patek, o Rolex, o Vacheron eram de mentira e que tinham enganado o meliante.

Meninos compram boné Von Dutch usado por um terço dos R$ 350 que custam o novo. Que nojo. Eu soube que camelôs já vendem cueca Burbury falsa. Só faltava ser usada também. Fazem prestação em dez vezes por uma Diesel. Daqui a pouco é falsa também, até porque já vendem etiqueta avulsa por aí.

É a ditadura do cool que seduz a burguesia, o proletariado e todas as editorias, as propagandas, as estratégias de marketing.

Claro que sofremos influência e que somos escravos dos nossos impulsos. E sabemos dessa auto–indulgência. Não tem nada de errado nisso. Nem certo. É assim.

Ser cool é a vacina de todas as marcas. É o que todos procuram. – Vamos ser a Puma do sabão em pó, a Apple das batedeiras, a Chanel dos sabonetes. Por que mesmo? Porque é cool ser assim e basta.

Mas essa qualidade, esquecemos, é fugaz, passageira, sazonal, superficial, cíclica também. E previsível também. O ontem é brega e o anteontem é cool. Passa–se um dia e o brega de ontem vira cool porque ele não é mais de ontem mas de anteontem. E assim por diante.

Este cool aí é o falso cool.

O que esquecemos é que existe mágica por detrás do sucesso. Existe sorte e pouca fabricação. Pouca falsificação. Há sim autenticidade, verdade, origem comprovada, sinceridade. Esta talvez seja a mais segura fórmula do cool sem aspas: ser o que se é. Cool é ser como sou, dizer a verdade – ou revela–la.

Temos que cuidar para distinguir os dois cools e os dois tipos de cool–hunting: tem os verdadeiros caçadores e os vomitadores. Tem aqueles que peneiram, ouvem, documentam e tem aqueles que chupam, se deslumbram e pontificam. A diferença se chama preconceito. Alguns querem a verdade ou a mais verdadeira das interpretações. Sem cara de nojo. Outros – a maioria – compram revistas nas bancas cool, visitam sites cool, conversam com formadores de opinião cools. E ignoram o resto porque o resto é povo, é menos, é ralé. A diferença se chama preconceito. Este cool é preconceituoso. Sempre.

Não vamos ser ridículos. Nem cegos. Nem loucos.

Não queremos essa lavagem cerebral não. Queremos entender as redes que integram o popular e a elite, o subversivo e o legal. O cool e o popular. O popular e o cool.

O Mercadão do sucesso do Fantástico

Existe sim, uma conexão sutil entre o cool e o popular. Há uma influência recíproca, sutil mas poderosa. O popular é a transgressão dos preconceitos. Popular é pegar o que tem a ver comigo e com outros como eu, tirar o que não tem a ver – até porque não entendo, e incorporar outras misturas. Popular é a transgressão das convenções. Até das leis. O popular é o que flui numa poderosa mídia, uma macro–mídia, uma anti–mídia. Uma mídia que não sabemos definir, que temos medo de entender, porque não sabemos dominar. O Zeitgeist, o espírito do tempo. É essa mídia que faz o hip–hop atrair milhões de jovens em Uganda, cantando os mesmos protestos de Manhatan. É essa mídia que faz milhões de jovens chineses cantarem o amor em shows de hip–hop – sim, hip–hop não é só protesto, pelo menos não na China. É essa mídia que faz a mega estrela coreana Boa ser hit no arqui–rival Japão. Uma coreana é ídolo popular no Japão!

É essa mídia que faz o tecno–brega ser sucesso em Belém e mesmo com a censura das TVs, revistas e jornais que conhecemos, é sucesso na periferia. É sucesso também aqui do lado, aqui no Largo da Batata.

É essa mídia que quero entender. É essa mídia que elege o verdadeiro cool, sem aspas. É esse cool aí que eu quero entender. Esse cool hunting aí, eu quero.

Quero entender o que faz a Mia plagiar a música da Daisy Tigrona. Entender o que faz a Daisy comprar, falsificado, o perfume da filha do terrorista do Sri Lanka.

Entender porque o Moby traz alguns mil neguinhos para o seu show e o Kelvis Duran alguns cem mil. Porque a Mia é capa de todas as revistas cool e a Daisy Tigrona é blockbuster nos camelôs de Duque de Caxias. Esse é o cool hunting que eu quero. O outro, é como o nome indica. [Webinsider]

Fernand Alphen (@Alphen) é publicitário. Mantém o Fernand Alphen's Blog.

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2 respostas

  1. E quem disse que não se faz cool hunting em camelôs, favelas, bailes funk e na periferia em geral?

    Como vocês acham que a calça das popozudas do funk – Gang – chegou até as Zoropa???

    Como a Mia passou a cantar funk?

    Porque o BEP veio gravar aqui?

    Lembram de Michael Jackson?

    bjos!

  2. Fernand, concordo 100%!
    Sou uma redatora querendo debandar para essa nova historia do cool, mas nao quero ser chupadora de ideias daZoropa, quero catar as tendencias no nosso rico povao, na feira da esquina ou na 25 de março! Continua abrindo a cabeça do povo com teus textos. Bjo cool, Marina

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