Vamos começar pelo fim? Este é o mapa do comportamento dos museus de ciências brasileiros na web. De início, a pesquisa cobria 138 instituições, mas 33 não possuíam (ou não foi encontrada) nenhuma forma de presença online, e os sítios de outros 11 estavam com problemas no carregamento.
Temos então 94 instituições representadas no diagrama abaixo, distribuídas nos três primeiros níveis.
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Mas o que isso significa?
Com o objetivo de melhor entender o processo de apropriação do ambiente online pelos museus, elaborei um instrumento de análise que contempla seis critérios: tipo de experiência proposta pelo museu, perfil interacionista das relações, perfil tecnológico e informacional, peculiaridade da estratégia e tipo de relação com o museu físico.
Foram considerados tantos os relatos de experiência dos artigos da Conferência Museum and Web (museus de diversas tipologias), quanto as formas de presença online dos museus de ciências brasileiros. A partir da categorização dos atributos, foi possível perceber quatro estágios de desenvolvimento de presença online, delimitados pelas peculiaridades de suas estratégias intrínsecas, a saber: divulgação do museu físico, ofertas de serviços complementares ao museu físico, apropriação da web pelo museu e apropriação do museu online pelo público.
Estas informações podem ser melhor visualizadas na Espiral Evolutiva das Formas de Presença Online ? Categoria Museus.
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O primeiro nível de presença online
O primeiro nível agrega os sítios cujo conteúdo limita-se à divulgação de informações institucionais do museu físico. A internet é considerada mais um canal de veiculação de informações reaproveitadas de outras mídias, normalmente, a impressa. Ainda não se pode falar em apropriação do ambiente online, mas de subutilização da web, seja por desconhecimento do seu potencial ou por idéias pré-concebidas de competição entre os domínios físico e virtual.
O ambiente online é explorado como ferramenta de marketing passivo, ou seja, o usuário deve saber o endereço do sítio ou encontrá-lo por meio de algum mecanismo de busca ou citação em sítios afins. O modelo de interação é predominantemente reativo, onde o museu posiciona-se como elemento transmissor de informações, numa relação monológica e polarizada.
A interação proposta limita-se ao acesso, excluindo possibilidades de consulta ou de intervenção, temporária ou permanente, no sistema.
No Tipo 1A, estão os sítios cujo conteúdo apresenta-se inteiramente no formato textual, geralmente ocupando apenas uma tela e de conteúdo estático (sem atualizações periódicas).
No subgrupo 1B, há maior exploração de recursos persuasivos como fotografias, simulacros do museu físico, mapas de localização, além de uma atualização constante de parte do conteúdo. Tecnologicamente, são utilizados recursos elementares, típicos da web de primeira geração.
O segundo nível de presença online
Os sítios de segundo nível oferecem serviços online complementares à experiência presencial, mas não necessariamente condicionados a esta. Estão focados em ampliar as relações do sujeito com os artefatos, seja disponibilizando o acervo para consulta remota (Tipo 2A) ou através de representações interativas dos mesmos, como simuladores e games (Tipo 2B).
O segundo caso, em que há produção de material específico para a web, marca o início da apropriação do ambiente online pelos museus. Este nível configura-se como interacionista reativo (PRIMO, 2007), dada a natureza fechada das trocas. Ainda que haja um canal de contato, como é de praxe em qualquer sítio, estes sistemas não são orientados ao diálogo com os usuários, mas à oferta de interação com os artefatos representados.
E mesmo que possam ser empregadas tecnologias de segunda e terceira gerações web na construção de modelos mais interativos, predomina a abordagem 1.0. No Tipo 2B, há atualização constante do conteúdo e as ações de comunicação começam a inserir a internet como meio de atingir o público-alvo e potencial dos museus, em especial, o público escolar.
O terceiro nível de presença online
No terceiro nível estão os sítios típicos da Web 2.0, em que o museu abre diversos canais de diálogo com seu público, incentivando-o a participar ativamente da construção do sítio, seja no registro de comentários para exibição pública, no cadastro para acesso a serviços personalizados e compartilháveis, na produção de conteúdo em formatos diversos, como áudio e vídeo.
Estes indicadores caracterizam o início de apropriação da web pelos museus. Se estas iniciativas limitam-se ao sítio oficial do museu são agrupadas no Tipo 3A, mas se extrapolam o domínio do sítio, e representam, portanto, um avanço em termos de estratégia de marketing online, os sítios são caracterizados como do Tipo 3B. Neste caso, os usuários da internet podem ter acesso ao conteúdo do museu em canais diversificados, como o Second Life, o Flickr e o iTunes, mesmo sem nunca terem estado no sítio do museu ou em uma visita presencial.
Esta prática revela uma ampliação na visão do que seja ?presença online? e ?público?. A relação com o museu físico é mutualista, onde esforços conjuntos são empregados para integrar as duas instâncias reconhecendo suas potencialidades. Estas ações, viabilizadas pelas tecnologias digitais, em especial as de terceira geração, tornam possível a concretização de um museu ubíquo, onde os conteúdos produzidos por pessoal especializado ou leigo, em qualquer das instâncias museais, são disponibilizados em formatos diversos e acessíveis por vários dispositivos: computador pessoal, celular, aparelhos de MP3, quiosques etc, online ou/e in loco.
Do ponto de vista tecnológico, os dados desta pesquisa revelaram uma relação direta entre o uso de tecnologias web de 2ª e 3ª gerações e os estágios de desenvolvimento online. Concomitantemente, percebe-se que a ocupação do ambiente virtual pelos museus de ciências brasileiros limita-se, quase que em sua totalidade, ao modelo transmissionista de divulgação do museu físico e de fornecimento de conteúdo complementar às visitas, em um comportamento típico da web de primeira geração.
O estágio de desenvolvimento primário de ocupação da internet por nossos museus, torna-se também evidente por outros indicadores, como a aparência amadora dos sítios, o uso exaustivo de texto, a desatualização das informações, os erros de carregamento das telas, os endereços longos e complexos que comprometem a encontrabilidade dos sítios e a ausência aparente de presença online extra-sítio.
Como se sabe, muitas tecnologias de socialização são gratuitamente distribuídas na rede, o que pode ser utilizado experimentalmente antes de se decidir que tipo de prática online melhor pode responder às necessidades de cada instituição.
O quarto nível de presença online ? os Museus-Fórum – será assunto do próximo artigo. [Webinsider]
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Referências:
PRIMO, A. Interação mediada por computador: comunicação, cibercultura, cognição. Porto Alegre: Sulina, 2007. 240 p.
Como citar este artigo:
ELER, Denise. Museus brasileiros estão em estágio inicial na web, 2008.
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Denise Eler
<strong>Denise Eler</strong> (denise.eler arroba gmail.com) é pesquisadora na área da Cibercultura, mestre em Educação Tecnológica, especialista em Gestão Estratégica da Informação, designer e professora universitária.
10 respostas
dica de leitura
por fabio
Obrigado, Denise. Já estou dando uma olhada. 🙂
Obrigada, Carlos 😉
Gostaria de saber se você tem dados sobre em que estágio estão países de outros países de igual desenvolvimento social/econômico ao nosso.
> A situação é muito parecida na América Latina e em Portugal. Já vi algumas pesquisas mas não me lembro a fonte.
E quais sítios você considera modelos no uso das práticas citadas acima.
>NO BRASIL (DADOS DE 2007)
Alguns exemplos cada categoria:
Nível 1
MUSEU DE HISTÓRIA NATURAL – Universidade Federal de Alagoas (Maceió-AL).
http://www.abcmc.org.br/mhn/
BOSQUE DA CIÊNCIA – INPA – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Manaus-AM) http://bosque.inpa.gov.br/
PARQUE BOTÂNICO DO CEARÁ
http://www.sfiec.org.br/meioambiente/parque_botanico.asp
MUSEU VIVO DA MEMÓRIA CANDANGA
Secretaria de Cultura (Brasília-DF).
http://www.sc.df.gov.br/paginas/museus/museus_02.htm
NÚCLEO DE CIÊNCIAS – PROEX/Universidade Federal do Espírito Santo (Vitória-ES). http://www.ufes.br/~nucleoc
NUDEC-NÚCLEO DE DESENVOLVIMENTO DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS Universidade Federal de Goiás (Goiânia-GO):
RIDEC-Rede Integrada para o Desenvolvimento e Ensino de Ciências (denominação antiga) http://www.fe.ufg.br/nudec3.html
Nível 2
MUSEU PARAENSE EMÍLIO GOELDI – CNPq (Belém-PA). http://www.museu-goeldi.br
CASA DA CIÊNCIA ? UFRJ – http://www.cciencia.ufrj.br/
ESTAÇÃO CIÊNCIA – USP http:://www.eciencia.usp.br
ESPAÇO CIÊNCIA VIVA – PUC-RJ http://www.cienciaviva.org.br/
MUSEU DE CIÊNCIAS NATURAIS – Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul
http://www.fzb.rs.gov.br/museu/
NÚCLEO ANTÁRTICO DA UFSM ? RGS – Universidade Federal de Santa Maria
http://www.ufsm.br/antartica/
Nível 3
LADIF ? LAB. DIDÁTICO DO INSTITUTO DE FÍSICA ? RIO DE JANEIRO – RJ
http://omnis.if.ufrj.br/~ladif/ladif.html
MUSEU DO UNIVERSO – Fundação Planetário da Cidade do Rio de Janeiro- RJ
http://www.rio.rj.gov.br/planetario/
MUSEU DA REPÚBLICA – IPHAN MINISTÉRIO DA CULTURA – RJ
http://www.museudarepublica.org.br/ e http://www.republicaonline.org.br ? Patrocínio da Petrobrás
SANTUÁRIO ECOLÓGICO DE PIPA – Tibau do Sul RN http://www.ecopipa.com.br
ESCOLA DO FUTURO – Cidade Universitária São Paulo http://www.lect.futuro.usp.br/
Parabéns pelo excelente artigo, Denise.
Gostaria de saber se você tem dados sobre em que estágio estão países de outros países de igual desenvolvimento social/econômico ao nosso. E quais sítios você considera modelos no uso das práticas citadas acima.
Quanto ao quarto estágio creio que ele pressupõe uma mudança radical na política de gestão de conteúdo.Estou curioso para ler seu próximo artigo!
Obrigada, Leonardo! Estou postando as imagens com melhor resolução no blog da Pesqui http://www.museuforum.blogspot.com/.
Lá vocês encontram também os quadros que sintetizam cada nível evolutivo descrito neste artigo.
Um dos melhores textos que já li sobre Internet. Serve para pensar sobre a presença on-line de qualquer tipo de atividade. Parabéns pelo artigo e obrigado pelas informações.
Com exceção da música, a maior parte dos outros campor asrtisticos ainda têm uma presença limitada na internet.
Por outro lado, pense em projetos web centrados em usuários… você acha que entidades mantenedoras destes espaços investiriam verba na contratação de agências para pesquisas?
Acredito também que uma investigação mais funda com a audiência certa vai revelar um perfil e necessidades bem especiais, talvez menos motivadoras que esperamos!
Sim, é verdade, Diego. No caso específico de minha pesquisa de Mestrado, analiso o siginifcado de um Museu de Ciências na contemporaneidade. Há um capítulo sobre isso, mas foge ao escopo deste site ;). O que percebi, e falarei disso no próximo artigo, é uma forma emergente de Museu, já conceituada na decada de 70, mas que agora tem um grande potencial com a web: O Museu Fórum.
Você pode ler sobre isso aqui http://www.museuforum.blogspot.com/. Espero continuar este diálogo, aqui ou lá no blog.
Um beijo. Denise
Apesar da relevância do assunto, é preciso articular outros elementos na temática abordada. É preciso pensar sobre ?o que é o museu na internet?, ?qual o papel do artista em épocas de cibercultura?, ?como as obras são manipuladas pela audiência no ambiente virtual?, etc. É preciso refletir sobre isso sob pena de cair em discursos chatos e unilaterais que se ocupam de pensar a internet como uma mídia autônoma, sem lembrar que ela é composta de contaminações do sujeito e das coisas do mundo.
Museus brasileiros estão em estágio inicial em museus.