Mudanças acontecem o tempo todo no trabalho. Avalie com cuidado para onde vai conduzir a sua carreira, pois você vai precisar. Este post de 2016 até que não envelheceu, concorda?
Você sabe o que é disrupção? Se costuma ler sobre tecnologia, carreira e a tão falada “economia do compartilhamento”, talvez já tenha passado por essa palavra.
O dicionário Aulete a define assim:
(dis.rup.ção)
sf.
1. Ruptura, rompimento, dirupção.
Um bom exemplo do que seria disrupção está num dos ícones do cinema dos anos 80, Robocop.
No filme, a criação de um policial ciborgue eficiente, com visão de longo alcance e pontaria sempre certeira não só é um sucesso, como cria um novo mercado e põe em cheque a existência do trabalho dos próprios policiais de Detroit.
Esse é o ponto: a disrupção acontece quando um produto, serviço ou tecnologia cria um novo mercado, com nova base de usuários, e destrói (ou torna obsoleto) o mercado no qual atua. Como o WhatsApp substituindo o SMS ou a Wikipedia apagando da memória a Barsa ou a Encarta (aquela do CD-ROM). Você lembra?
Foi o que vimos acontecer nas indústrias da música (Spotify) e dos filmes (Netflix) e, por ora em menor escala, na dos livros (Kindle) e da educação (Coursera, EDX). Todos são exemplos recentes de disrupção.
Netflix e Spotfy descendem do pioneiro ilegal Napster
No caso das músicas e dos filmes, a ironia é que se há mais de uma década não houvesse existido a troca de arquivos de maneira ilegal pela web, com as plataformas de compartilhamento como o Napster e os sites piratas de mp3 e filmes, possivelmente o Spotify e o Netflix teriam tido muita dificuldade no mercado, como aponta Alexa Clay no livro A Economia dos Desajustados.
Mais ou menos o mesmo que fez com que o iPod se tornasse um hit, o soberano dos mp3 players. Antes desse dispositivo da Apple, tudo o que foi inventado antes, sem muita sofisticação nem qualquer apelo em design ou capacidade de armazenamento, se tornou irrelevante (eu mesmo tive um Yepp em 99: foi lançado pela Samsung e tinha ridículos 64MB de capacidade!).
Ou seja, pode-se dizer que a “leitura” correta do momento foi fundamental para que essas ideias causassem disrupção e prosperassem.
Mas essas digressões são apenas para exemplificar. Também para provocar reflexão e mostrar que, já há algum tempo, o mundo, os mercados e nossas próprias carreiras e profissões vêm sendo alterados por invenções disruptivas.
Posso afirmar isso baseado em minha área de atuação e minha formação como um bom exemplo de profissão que foi alterada por uma nova tecnologia: a de professor.
Desde que me formei, há quase 20 anos, eu venho lidando com a expectativa que o e-learning se tornasse uma realidade viável de ensino aqui no Brasil. Uma alternativa mais prática, com menor custo, disponível a qualquer hora e em qualquer lugar. Para estudar e para treinar. Para pessoas e para empresas.
Mas para os professores, a história foi um pouco diferente. Aqueles que não ficaram imóveis diante (do início) da mudança, vieram se destacando e ganhando mercado e recebendo propostas de emprego e trabalho (sim, não acredite em tudo o que contam por aí sobre isso, o “fim do emprego”) em empresas de tecnologia, em estatais, em universidades e em quaisquer outras empresas, de diferentes áreas, que estivessem investindo em educação corporativa e treinamento.
Isso não apenas separou os professores como profissionais, mas ao mesmo tempo, ironicamente, os nivelou: os mais novos, sem tanta experiência profissional, mas com conhecimento técnico e pedagógico e domínio das ferramentas tecnológicas e da web, se sobressaíram na área. Alguns até mudaram de profissão ou expandiram seu expertise, como foi o meu caso. Já os profissionais mais experientes, não necessariamente mais velhos, mas que “perderam o bonde” do início da mudança em suas profissões, foram ficando pra trás e tiveram que correr para acompanhar as mudanças do mercado.
Inegável que havia muita desconfiança com um “ensino feito pela tela de um computador” e “sem contato olho no olho”, mas a tecnologia é implacável. O fim da história é o que ainda estamos vendo, com as faculdades oferecendo graduação ou pós a distância, via e-learning, e plataformas como o Coursera sendo levadas a sério — o que mostra que aqueles que se arriscaram não estavam errados.
De certa forma, apesar de toda a desconfiança, o e-learning acabou se tornando de fato uma opção muito válida e reconhecida. Eu tive a sorte de trabalhar nessa área desde cedo na minha carreira, mas ter me mantido aberto às mudanças e oportunidades é que foi um diferencial e tanto. Espero que você, no seu caso, esteja pensando nisso agora de verdade.
Quer mais? O avanço na automação, no uso de Big Data, na complexidade e alcance dos algoritmos e na Inteligência Artificial podem mudar muito o mercado de trabalho. Na verdade, este já está mudando, mas isso não significa que vai acabar — apenas vai ficar diferente.
Robôs já são redatores
Computadores já são programados para reconhecer padrões, criar hipóteses, implementar soluções e decifrar comunicações. Mas agora, eles também podem redigir notícias, prever decisões da Suprema Corte americana e traduzir expressões e metáforas entre 2 idiomas em tempo real e com boa precisão.
Só pra ficar nos exemplos mais simples, mas existe uma lista meio catastrófica, publicada em 2014, que cita quais as profissões mais ou menos propensas a ser substituídas por robôs/sistemas automatizados. Eu não acho que seja por aí, mas vale para pensar a respeito.
Claro, é um avanço e tanto conseguir romper a barreira das diferenças linguísticas numa conversação, com toda a riqueza de detalhes e seus diferentes significados, de acordo com o contexto. Quem se formou na área sabe bem disso, já que a linguagem é uma das mais complexas habilidades humanas e uma das mais difíceis tarefas cognitivas. Mas, isso não significa que um tradutor vai deixar de trabalhar e ganhar seu dinheiro, sabendo se adaptar. O grande diferencial, aqui, é que uma máquina jamais poderá interpretar e traduzir com exatidão o que uma pessoa está querendo dizer com sua diferenças sutis na entonação de voz, na sua expressão facial ou sua linguagem corporal.
Os tradutores digitais ou aqueles que não acompanharem as mudanças poderão realizar o trabalho, mas será o de apenas trocar palavras de uma língua a outra. Os melhores, os que se adaptam e evoluem de acordo com as mudanças, poderão ser verdadeiros “arquitetos linguísticos” com a capacidade de compreender e solucionar uma das habilidades humanas mais importantes num mundo que agora acontece, em grande parte, entre telas.
Tudo isso para afirmar que sua profissão não vai acabar, mas deve se transformar e mudar para sempre em breve (se ainda não foi). Se você quiser, pode até interpretar que acabará sim, mas “renascerá” de outra forma logo em seguida. É o mesmo que aconteceu com diversos mercados no mundo.
Volte aos parágrafos anteriores do texto e note que: ainda existem gravadoras, apesar da web e dos artistas independentes; cinemas seguem em atividade, mesmo com o streaming; livrarias físicas continuam vendendo livros, além de ebooks; ensino e aprendizagem coexistem dentro e fora da web, seja nos MOOCs ou no YouTube.
Para todas essas atividades, continuam existindo as mesmas profissões, com a diferença que houve adaptações à medida em que as mudanças foram sendo implementadas no mercado, com diversas disrupções e tecnologias.
Assim, hoje existem professores que produzem conteúdos didáticos e educativos e ainda precisam entender como combinar texto, interação e visual lado a lado; jornalistas que precisam saber alguma coisa de codificação/programação para a web a fim de cuidar de blogs e publicações online; designers que necessitam conhecer o fluxo da informação na internet para desenvolver interfaces simples para os usuários; atores que aprenderam a produzir vídeos com qualidade profissional para alcançar novos públicos e divulgar o trabalho; psicólogos que desenvolveram formas de atendimento online etc. A lista seria longa…
Sem dúvida, há mudanças acontecendo no mundo do trabalho há mais de 15 anos, quando conceitos como (ser) freelancer ou (trabalhar em) home office começaram a fazer sentido aqui por estas terras. Agora, já pulamos algumas etapas e é bem possível que aqueles que souberem se adaptar à tecnologia e entendê-la, acompanhar as mudanças e unir isso ao seu fator pessoal — algo que toda a IA, algoritmos e máquinas nunca terão — poderão garantir a continuidade de suas carreiras, seja em que profissão for.
Acredito que o futuro pertencerá àquelas pessoas que identificarão o potencial de atuais ou futuras oportunidades, tendo a sensibilidade de entendê-las e saber onde e como existem, buscando seu próprio caminho em meio a elas.
Quase sempre, os melhores caminhos se revelam quando poucos pisam nele, principalmente porque nem todos sabem como identificar e aproveitar as oportunidades.
Nós somos o que pensamos. Tudo que somos surge com nossos pensamentos.
Buda
O ruim é que, de uma forma ou de outra, por diversas razões, muitos profissionais se tornarão obsoletos, comoditizados e irrelevantes. Talvez até já esteja acontecendo em empregos, não profissões, que não exigem especialização, como os do varejo, em meio ao alcance do e-commerce hoje em dia.
A boa notícia é que aqueles que estiverem atentos ao mundo, reconhecerem as tendências e souberem se adaptar a essa nova realidade terão maior capacidade de prosperar, mesmo com toda a disrupção. Ter atenção e cuidado com a própria carreira é hoje, muito mais que antes, uma habilidade que precisa ser desenvolvida.
É preciso nos conhecermos, conhecer nossos pontos fracos e fortes e o que de melhor cada um de nós pode oferecer. Se você não atualizou seu currículo, faça-o agora. Dê uma olhada no que você já percorreu até aqui e verifique como suas experiências, habilidades e conhecimentos podem combinar com tudo o que esse novo mundo traz de oportunidades.
Um checklist básico seria:
- Buscar formas de se diferenciar e prosperar;
- Descobrir o que você faz de maneira única;
- Saber se comunicar e escrever.
E uma recomendação final: ser “à prova de futuro” é uma necessidade.[Webinsider]
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Alexandre Bobeda
Alexandre Bobeda (@dezbloqueio) é redator, professor, designer instrucional, autor publicado. Criou o dezbloqueio conteúdo & ideias.