Sapo na panela é não resistir ao dedo nervoso contaminado por algoritmos que compram nosso tempo em troca de recompensas instantâneas e supérfluas.
Em 1960, ocorreu no Brasil um dos maiores genocídios indígenas de que se tem notícia: o massacre do paralelo 11. Foram 3500 índios da etnia Cinta-Larga assassinados por fazendeiros e grileiros usando os métodos mais atrozes, como, por exemplo, atirando, de aviões, nas aldeias, brinquedos contaminados com vírus da gripe, varíola ou sarampo.
Para além da crueldade e covardia do expediente, os indígenas foram eliminados tão “facilmente” porque não tinham anticorpos, essas “proteínas do sistema imunitário que nos protege contra agentes invasores”.
Uma sociedade também pode desenvolver anticorpos culturais ou éticos para não se deixar contaminar por qualquer agente invasor.
E são tantos, tão rápidos, tão mutáveis, tão letais, tão sub-reptícios, dissimulados e fingidores.
Somos todos Cinta-Largas quando se trata de maratonar, browsear, datear, seguir, betear, bestamente.
Faltam-nos anticorpos pra lutar contra a dopamina das séries que, como o nome indica, serializam nossa adição.
Não temos anticorpos suficientes para resistir ao dedo nervoso contaminado por algoritmos que compram nosso tempo em troca de recompensas instantâneas e supérfluas.
Não temos anticorpos para lutar contra a falta de oportunidades de uma sociedade injusta, desigual e preconceituosa, caindo no lero dos vigaristas que ganham sobre tudo que você perde.
Somos impotentes frente à tentação de corpos digital e quimicamente modificados.
Driblamos os anticorpos da decência e pudor, os anticorpos da vergonha e da crítica, os anticorpos da educação e civilidade, do respeito e compaixão, da sinceridade e inteligência quando damos, sem pedir nada em troca, nossa raríssima atenção aos vendilhões da internet e suas corrompidas influências.
Não temos anticorpos para lutar contra a falta de oportunidades de uma sociedade injusta, desigual e preconceituosa, caindo no lero dos vigaristas que ganham sobre tudo que você perde e que, portanto, fingem que ganham para você perder.
É claro que não tem nada de errado em parafusar a bunda no sofá noite adentro, nada de errado em dar uma espiada nas macacadas dos exibidos, sair na pegação sem amanhã, xeretar a vida alheia ou ter fé na sorte divina.
Mas é como a experiência do sapo na panela (é uma metáfora, galera, uma metáfora): se colocarmos um sapo numa panela com água muito quente, ele pula fora. Mas se o sapo for colocado na panela com água fria que vai esquentando aos poucos, ele fica. E morre fervido.
Nada de errado de entrar na panela quentinha. Mas sem anticorpo, a gente pode se queimar feio. [Webinsider]
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