No colégio estudei sobre os três poderes: o executivo, o legislativo e o judiciário. Algum tempo depois, já na faculdade, falava-se no quarto poder, o da imprensa, no sentido de proteger os direitos do cidadão denunciando abusos, injustiças e má administração governamental sob a bandeira de defesa da democracia.
Atualmente, na era da informação, catalisada pela internet e seus zilhões de páginas, imagens, vídeos e redes sociais, acordo pensando num quinto poder.
O poder do consumidor e seu conteúdo colaborativo.
Em julho de 2005, Jeff Jarvis, teve uma experiência negativa com seu notebook Dell. Depois de tentativas frustradas de resolver seu problema no suporte da empresa, postou sua fúria em seu blog Buzzmachine.com. Em algumas horas seu blog começou a ser inundado por experiências de outros consumidores da empresa também insatisfeitos. Poucos dias depois outros blogs com conteúdos ácidos sobre os mesmos problemas, começaram a pipocar.
Uma semana depois, ao se fazer uma busca pela palavra Dell no Google, o blog de Jeff aparecia no topo da página de resultados. Foi o suficiente para chamar a atenção de revistas e jornais do porte da PC World, Business Week e The Wall Street Journal. Em agosto do mesmo ano a Dell publicou em seu site uma resposta ao problema. Tarde demais. Um incontrolável círculo vicioso de geração de conteúdo negativo havia sido criado.
Em uma pesquisa recente feita pelo DataFolha com internautas brasileiros, foi publicado que 53% dos consumidores usam opiniões postadas por outros usuários na internet antes de decidir pela compra de um produto. Depois de assistir a um ingênuo vídeo caseiro postado no YouTube por um jovem americano, tomei minha decisão de comprar um BlackBerry ao invés de um iPhone. Uma comunidade no Orkut me fez optar por uma TV LG ao invés de uma Samsumg.
Cada vez mais, consumidores como eu e você, baseiam suas decisões de compras em opiniões postadas por outros usuários em blogs, fotologs, fóruns, comunidades e sites especializados.
No comércio eletrônico, as resenhas e opiniões dos consumidores vêm sendo cada vez mais exploradas por fabricantes e lojas virtuais. A Amazon utiliza com excelência o conteúdo gerado por seus consumidores. É possível inclusive ordenar os produtos baseando-se nas notas dadas pelas pessoas que os compraram. Outra loja virtual, a Bazuca.com, do Chile, incentiva seus visitantes com créditos em compras, a opinarem sobre produtos. De notebooks a vinhos.
Cada vez mais as empresas se preocupam em acompanhar o que está sendo dito sobre suas marcas, produtos e serviços na internet. Se na época dos nossos avôs, um cliente insatisfeito compartilhava sua experiência negativa com onze pessoas, hoje essa frustração tem ao seu dispor um megafone virtual de alcance ilimitado: a internet.
Através dela é possível dissipar de maneira irreversível sua angústia e revolta com produtos de má qualidade e serviços mal prestados. Irreversível sim, porque blogs, comunidades e fóruns não são como grafites de parede que podem ser apagados da noite para o dia.
O quinto poder é mais do que colocar suas insatisfações como consumidor num amplificador. É o poder de fazer produtos voltarem para as mesas dos projetistas para serem redesenhados. É o poder de fazer as empresas reconhecerem publicamente quando errarem e de enaltecer aquelas que se preocupam realmente em trazer qualidade e inovação para o mercado.
De forma subjetiva, mas em progressão geométrica, esse poder aumenta cada vez mais. Se hoje ele tem influência sobre produtos, serviços e empresas, por que amanhã não teria sobre governos? A última eleição nos Estados Unidos mostrou a força da internet como veículo de discussões e apoio às propostas dos candidatos. Várias ONGs pelo mundo já usam a web para publicar informações de administração pública no combate à corrupção, como a Transparência Brasil.
Se hoje ao chegar em casa depois de um dia de trabalho, ao invés de ligar a televisão você entrar na internet para publicar uma foto engraçada do seu cachorro, um vídeo do seu filho dando os primeiros passos, escrever sobre um prato exótico que comeu no almoço ou simplesmente desabafar sob o trânsito horrível de sua cidade, parabéns! Você faz parte do quinto poder.
Consumidores, uni-vos. [Webinsider]
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Mauricio Salvador
Mauricio Salvador é Mestre em Comunicação e Administração, professor, autor do livros Como Abrir uma Loja Virtual de Sucesso e Gerente de Ecommerce, coordenador da Ecommerce School, sócio diretor da GS Ecommerce. No Twitter é @mauriciorj.
7 respostas
Bacana a forma como demonstrou a idéia, que pode não ser nova mas poucas pessoas sabem que pode utilizá-la. Talvez com o tempo, mais e mais pessoas não só façam uso desse quinto poder, como também baseiem suas compras, seu voto suas decisões procurando por reputação na internet. Só temos a ganhar com esse procedimento.
Valeu.
AUTOR DO LIVRO ONDE SE ESCONDE A MEDIOCRIDADE
DE ONDE FORAM RETIRADAS AS OBSERVAÇÕES ACIMA.
ABRAÇOS
Parabéns. O artigo está ótimo.
Já enviei o comentário. Será que foi ? ogier
Maurício,
primeiramente, parabéns pela perspicácia e poder de síntese. Falaste sobre conteúdo colaborativo de uma forma fluida e – aplausos – sem usar cichês.
Na minha opinião, a proória web como media solicita a participação dos consumidores – e cada vez mais. Essas potencialidades sociais e colaborativas sempre estiveram no cerne da web, como aponta o próprio Tim Berners-Lee no célebre Weaving the Web.
O que existe hoje é uma evoluçã da compreensão que se tem do meio web somada a um desenvolvimento tecnológico acelerado, combinação que resulta em um ambiente naturalmente mais colaborativo, com maior intensidade de trocas em diversas dimensões.
Parabéns pelo post e pela visão perpicaz dos novos processos midiáticos digitais.
O quinto poder representa não só o direito do consumidor exigir melhores produtos, como tambem ,assistencia pós venda,canais de distribuição mais facilitados,meios de comunicação com o consumidor tanto na pré venda como na pós venda que satisfaçam desejos do consumidor.Esses desejos podem ser não somente de consumo (de ter um produto,de adotar uma idéia ,de ter uma opinião ),mas incluir,por exemplo,outros requisitos não usuais em mercadologia, como:
não comprar de uma emprêsa que não respeite legislação ambiental,ou que use defensivos agrícolas condenados, ou que use pagar verbas de propaganda para determinados apresentadores de TV
que apenas dão retorno mercadológico, inflando desmesuradamente seus salários, só por que dão audiência.Essa atitude meritória tem um nome: CONSUMO ALTERNATIVO.
O consumidor terá sua opinião detectada através do retorno mercadológico na venda do produto,ou serviço ,ou na compra de uma idéia e ,assim, as emprêsas, que não estão para perder consumidores,
terão de levar em conta essa REPULSA de consumo.
Estaremos abrindo mão do desejo de TER, em troca de táticas mercadológicas que sejam mais de acôrdo com o que pensamos.É a única forma de boicotarmos o que alguns apresentadores de TV abocanham, por exemplo.
Olá Maurício. Concordo contigo. No entanto, não vejo apenas a era tecnológica como fundamental para o advento do que você chama de quinto poder. Nas ruas, nas conversas de bares e salões de beleza, nas conversas entre vizinhos… já era feita, e continua sendo feita, a propagação de uma ideia, positiva ou negativa. É um poder que nasce com o ser humano nessa sociedade capitalista. A internet veio apenas como uma ferramenta de apoio a estas situações. Vejo pelos exemplos que tenho em casa: meu pais não utilizam a internet e chegam sempre com assuntos novos, posições diferentes sobre um tema ou outro que colheram da convivência com os colegas da empresa ou do salão de beleza. Tem o caso do menininho que chega em casa influenciado pelo coleguinha da escola infantil. Claro que essas micro-convenções de ideias não têm o mesmo efeito amplificador, mas têm lá o seu efeito borboleta. Saudações!