Comunidades virtuais: quando o leitor é a notícia

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Uma nova forma de gerar conteúdo está ganhando espaço no mundo virtual – é o jornalismo colaborativo. Se até aqui a indústria da informação monopoliza o fato, agora o usuário também escreve.

No Brasil essa tendência ainda é incipiente – mas ela está no ar. O site Pessoas do Século Passado, por exemplo, é uma espécie de blog coletivo alimentado exclusivamente por histórias de internautas. Mas este material não entra direto no ar; antes, passa pela edição e aprovação da equipe à frente da iniciativa. A divulgação, assim como a produção de conteúdo, acontece de forma viral, por recomendação boca–a–boca dos usuários.

Nos Estados Unidos, um dos cases de sucesso da internet é o Slashdot, um site de notícias tecnológicas que não produz conteúdo da forma tradicional. É um catalisador de informação gerido por quatro geeks e abastecido pela colaboração de sua base de usuários.

O trabalho colaborativo não é novidade. As revistas científicas têm, entre outros, o propósito de compartilhar resultados de pesquisas. Herdeiro contemporâneo desta tradição, o sistema operacional Linux continua sendo aprimorado pela própria comunidade de usuários do programa – cujo código fica permanentemente aberto justamente para que os usuários possam adaptá–lo segundo suas necessidades e compartilhar as modificações através do site da empresa que licencia o aplicativo.

Open source como modelo de trabalho

O filósofo e pesquisador finlandês Pekka Himanen, que publicou com Linus Tovald e Manuel Castells um livro sobre o fenômeno Linux (veja extratos no site Hacker Ethic), detectou formas alternativas de pagamento para estimular a participação da comunidade. O prestígio, por exemplo, é uma moeda corrente no mundo dos hackers e programadores em geral. A fascinação desse grupo por jogos de RPG e simulações de combate sugere a identificação com um sistema de valores mais parecido com o feudal: da mesma forma como um cavaleiro de armadura era respeitado pelas suas façanhas, o “techie” se torna popular quando invade o site do Pentágono, publica uma mensagem no SlashDot ou ao ter suas sugestões incorporadas ao código–mãe do Linux.

Além do prestígio, outro fator que motiva a participação voluntária pode ser explicado através do Dilema do Prisioneiro, um capítulo famoso da Teoria dos Jogos. Segundo esse Dilema, a primeira tendência do ser humano é ser egoísta. De acordo com sua lógica, geralmente quem quebra o retrovisor de um carro estacionado vai embora sem preocupar–se em pagar o prejuízo. Mas se o carro é de um conhecido, aumenta a probabilidade de se precisar da ajuda dessa pessoa no futuro e, nesse caso, vale a pena manter a amizade e arcar com o prejuízo. Resumindo: eu vou ajudar quem possa vir a me ajudar.

Mas vamos partir para exemplos mais mundanos que produtos como Linux e Slashdot, e que não servem a uma comunidade específica como é o caso destes produtos. O que sobra?

Um case asiático

Um site coreano está demonstrando que a colaboração é uma conseqüência natural em um mundo interconectado em tempo real. Na Coréia, onde 70% das residências têm conexão de internet por banda larga, o modelo de jornalismo colaborativo já tem um “case” de sucesso. Ohmynews (em coreano) é um site de notícias lançado há três anos e que funciona com o apoio de uma equipe de 26.300 internautas–repórteres cadastrados. Esses usuários recebem entre nada e 16 dólares para escrever cerca de 80% das matérias publicadas diariamente.

A mídia tradicional, preocupada com o sucesso do Ohmynews, critica a iniciativa dizendo que o modelo de colaboração permite que “marketeiros” e ativistas políticos influenciem a opinião pública plantando notícias falsas. É para evitar que isso aconteça que o Ohmynews tem 38 editores e repórteres profissionais que checam os fatos enviados antes da publicação das matérias. E está funcionando: até hoje, apenas duas notícias levaram a processos por difamação contra o site.

A popularidade da nova proposta aumentou em junho do ano passado quando um veículo militar americano atropelou e matou acidentalmente duas estudantes coreanas. Um “internauta–repórter” escreveu uma nota convocando a população às ruas para protestar e resultado foi uma das maiores manifestações da história recente da Coréia. Outro exemplo da importância do Ohmynews veio do novo presidente eleito, Roh Moo–hyun, que escolheu o site para dar sua primeira entrevista como mandatário.

E no Brasil?

As idéias de trabalho colaborativo associadas à nova mídia estão no ar e a ponto de condensação. A popularidade do blog tornou a ferramenta obrigatória nos grandes portais. E o blog é muito mais que uma publicador de amenidades da vida privada: é uma solução ao mesmo tempo simples e versátil e que está sendo levada a sério por seu potencial jornalístico por gigantes da mídia como a MSNBC.

Além do blog, a mídia vem adotando outras ferramentas de comunidade para estabelecer contado de duas vias com o público. A Globo lidera o comboio fortalecendo seus programas de TV associando–os a páginas interativas e divulgando a iniciativa. O e–mail foi adotado pela imprensa escrita para estimular o contato entre leitores e jornalistas. O rádio segue o mesmo caminho: no Programa Pânico, transmitido em rede nacional pela Jovem Pan FM para uma audiência de 20 milhões de pessoas, locutores conversam com ouvintes em tempo real através de chats. E dentro mesmo da web existem iniciativas maduras como a lista de discussão Radinho de Pilha, que reúne uma massa crítica consistente de profissionais da internet que se ajuda mutuamente compartilhando conhecimento. Então, o que falta acontecer?

Receita de bolo

Falta aplicar com consciência o princípio ativo da internet – a interatividade – para despertar comunidades para o trabalho colaborativo. Falta identificar e atrair grupos que sejam formadores de opinião e estejam capacitados para usar a internet como ferramenta de trabalho. E, sobretudo, falta visão do mercado, já que em tempos de recessão como agora, a colaboração possibilita um processo de trabalho eficiente, enxuto e dinâmico. Além do mais, a colaboração gera fidelidade porque, ao dar à comunidade maior poder de decisão sobre o produto, reflete melhor as expectativas dela.

Existe uma variedade de soluções shareware na internet, como o WebCrossing, que disponibilizam ferramentas completas de colaboração online, incluindo chat, blog, mural de mensagem e as listas de discussão. Aliás, a lista, que passou para segundo plano com o aparecimento do chat e do blog, é um dos produtos mais antigos da Era Digital e que continua entre os mais poderosos agregadores de interesses na rede.

Para os empreendedores que sobreviveram à crise e para os muitos órfãos das ponto–com, desenvolver um site com conteúdo colaborativo pode ser um modelo de negócio promissor. Exige–se um investimento baixo – o registro do domínio, o valor da hospedagem e um trabalho de cultivo da comunidade relativamente pequeno e que pode adequar–se ao esquema de freelas já bastante difundido entre profissionais brasileiros. Por isso, o verdadeiro desafio está em popularizar o conceito através da experimentação em um processo de tentativa e erro envolvendo ferramentas da web, da telefonia celular e da mídia tradicional. E aproveitando o assunto e que esta é uma revista digital, por que não pôr mãos à obra mandando os seus comentários? [Webinsider]

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Juliano Spyer (www.julianospyer.com.br) é mestre pelo programa de antropologia digital da University College London e atua como consultor, pesquisador e palestrante. É autor de Conectado (Zahar, 2007), primeiro livro brasileiro sobre mídia social.

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2 respostas

  1. QUAIS SÃO OS TIPOS DE SERVIÇOS QUE SÃO FORNECIDOS, PARA QUE EU POSSA ME ENTREGAR NESTE TRABALHO, GOSTARIA DE SABER O QUE DEVO FAZER, POIS SEI QUE AINDA PRECISO APRENDER MUITO, GOSTARIA QUE SE POSSIVÉL, VOCÊS ME AJUDASSEM A ME INTEGRAR,NESTE TIPO DE TRABALHO.
    ESPERO POR MAIS INFORMAÇÒES,

    ATENCIOSAMENTE: O MEU MUITO ,OBRIGADO

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