TV, mídia (ainda) soberana

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Apesar dos abalos recentes lá e cá, a televisão continua a rainha absoluta dos meios de comunicação. E deve permanecer no trono por muito tempo ainda, transformada e retransformada em vários híbridos.

As mudanças tecnológicas, o crescimento da oferta de canais, a pulverização da audiência, a chegada da internet — são muitas as ameaças. Mas são ameaças de mentirinha, em boa parte. Todas as mídias do século 20 passaram pelo mesmo ciclo de morte anunciada por ocasião do surgimento de uma mídia mais nova.

O jornal seria fuzilado pelo rádio, que seria afogado pelo cinema, que seria enterrado pela TV, etc. Os interesses econômicos por trás de cada tecnologia alimentavam essas profecias de araque, quando na verdade as pessoas querem tudo ao mesmo tempo — uma combinação de todas essas formas e meios, cada uma com suas particularidades.

A morte da TV foi dada como certa quando a internet entrou em cena. Já falamos sobre esse assunto em colunas anteriores, e certamente voltaremos a abordar a questão, já que esse cenário é muito veloz, com guinadas surpreendentes. Minha opinião é que a internet jamais ameaçou ou vai ameaçar a televisão. A internet é como a irmã caçula (e genial) da TV, capaz de realizar todas as promessas vãs feitas ao longo de décadas pelo marketing das emissoras.

Quero comentar aqui o fato de que as pessoas querem controle sobre suas atividades de entretenimento e cultura. Isso é fácil com um livro ou jornal — todos nós somos editores naturais de conteúdos: pulamos as seções do jornal que não nos interessam, avançamos nas partes chatas do romance.

Com as mídias elétricas, esse controle pessoal foi subtraído a princípio. Programas de rádio, filmes e shows de TV foram concebidos para serem consumidos de forma passiva. Intencionalmente, já que esses meios nasceram como plataformas publicitárias. O conteúdo das mídias elétricas é geralmente patrocinado por anunciantes, e esses querem garantir o retorno de seu investimento. Idealmente, o consumidor ficaria exposto à mensagem publicitária, reforçada diversas vezes durante o programa, sem interrupções ou pausas para o toalete.

Por esse motivo, qualquer inovação que dê (ou devolva) controle ao consumidor é entendida como ameaça ao equilíbrio comercial dessas mídias. Ainda nos anos 50, o surgimento do controle remoto eliminou a necessidade de sair do sofá e andar 10 passos para trocar de canal. O zapping já tem quase 60 anos. Décadas depois, o gravador doméstico de videocassete permitiu a primeira fuga do tempo real. Tornou possível gravar programas para guardar ou apenas para ver em outro horário. E com o botão de “FF”, pela primeira vez foi possível pular os intervalos comerciais.

É claro que cada inovação desse tipo representou uma enorme dor de cabeça para emissoras, anunciantes e agências publicitárias, que disputam eterna queda de braço com os fabricantes de equipamentos.

A enxaqueca mais recente foi o surgimento dos gravadores digitais de TV (DVRs) — em particular o TiVo. Em abril de 2008, o TiVo tinha 3,801 milhões de assinantes nos EUA: 1,73 milhão com seus próprios aparelhos e 2,07 milhões com aparelhos da DirecTV (os dados são da empresa). O TiVo e outros sistemas de DVR causaram um impacto devastador sobre o ecossistema publicitário da televisão.

Tanto que em 2002, Jamie Kellner, CEO da Turner Broadcasting, declarou que pular os comerciais de um programa era simplesmente um furto. Kellner disse que o espectador tem um “contrato” com a emissora, que implica assistir os anúncios que patrocinavam a atração. Como a programação é paga pelos anunciantes, pular os anúncios seria roubar os programas.

Apesar de acintosa, a declaração faz sentido comercial. Desde então, os anunciantes e emissoras criaram estratégias para amenizar esse problema — inserindo anúncios durante o programa, em tickers, pop-ups e mini-janelas. O merchandising embutido na narrativa se tornou cada vez mais sofisticado.

Mais do que permitir o “roubo” de programas, o DVR causou uma mudança ainda mais significativa: a tecnologia permite que o telespectador rompa definitivamente com a grade de programação criada pelas emissoras. O zapping do controle remoto já permitia uma certa personalização, mas o TiVo deixa o espectador criar sua própria grade.

Ele pode programar o aparelho para gravar diversas atrações para ver mais tarde ou em outro dia, numa sequência que ele mesmo escolhe. E isso é muito sério — a ideia de “horário nobre” está finalmente extinta. Anúncios criados para serem exibidos em determinados horários (como comerciais de alimentos na hora do jantar, por exemplo) deixam de ser relevantes.

Esse cenário é assustador para as empresas — anunciantes, emissoras e agências são unânimes ao considerar o DVR uma grave ameaça. Tanto que o sistema ainda não conseguiu se espalhar pelo mundo todo. A entrada do TiVo na Europa foi tímida, com fortes pressões tanto dos anunciantes como dos órgãos de regulamentação. No Japão, a associação de emissoras comerciais fez lobby para tornar ilegais as tecnologias que permitam pular os comerciais.

Mas é como tentar conter um maremoto. A onda pode até demorar, mas acabará varrendo os sete mares. [Webinsider]

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Sergio Kulpas (sergiokulpas@gmail.com) é jornalista e escritor.

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8 respostas

  1. O DVR é uma tendência sim. A opção de não ver os comerciais é uma realidade sim.

    O que vai acontecer com a mídia televisiva ninguém sabe.

    Mas que ela sentirá um abalo significativo com a tal da Nova Propaganda não há dúvidas.

    O que fazer então ?

    O Branded Content é uma boa opção. O espectador busca conteúdo e entretenimento. Por que não incluir o Branding dentro disso ? E de repente fazer com que o antigo comercial ganhe uma nova roupagem.

    abs
    Raul T.
    —————————–
    http://www.soluttia.com.br

  2. Gostei da matéria do Sérgio Kulpas e também dessa parte do comentário do Gilber Machado :

    E do ponto de vista da propaganda, sem dúvida muda muita coisa! Mais conteúdo, mais serviço, mais comunidade, menos anuncio!

    Imagino a TV e propaganda nela sendo arrastadas para dentro de uma areia movediça que eu tentaria identificar como uma Internet Comunal.

    As pessoas estão encontrando mais liberdade na internet e assistir TV está ficando desnecessário.

    Tenho a programação completa da NET, mas me incomoda fica longe do micro, onde sou ator (somos todos e aqui mesmo é assim).

    Pois é isso mesmo o que queremos:

    Mais conteúdo, mais serviço, mais comunidade, menos anuncio!

  3. TV = atitude passiva

    Computador = atitude ativa

    Celular = mobilidade

    Acho que não existe um mata o outro, mas modelos de distribuição de conteúdo e interatividade complementares e integrados.

    E do ponto de vista da propaganda, sem dúvida muda muita coisa! Mais conteúdo, mais serviço, mais comunidade, menos anuncio!

  4. Os EUA tem mais de 105 milhões de domícilios, segundo o último censo, e aproximadamente 300 milhões de habitantes.
    Tirando todo o buzz em torno dele, com apenas 3 milhões de assinantes o DVR ainda é uma gota no oceano, mesmo considerando a qualificação desses consumidores.

  5. Sergio, parabéns pelo post provocativo.
    Penso que essa inovação tecnológica pode provocar uma mudança na forma como as emissoras vivem o que a internet consagrou como economia da atenção.
    Pode.
    É impressionante como as empresas relutam em perceber os novos diferenciais: conteúdo de qualidade, participação do consumidor (no caso do TiVo, pelo controle da programação) e valorização da dimensão local, no caso das notícias.

    Minha opinião é que a internet jamais ameaçou ou vai ameaçar a televisão. A internet é como a irmã caçula (e genial) da TV, capaz de realizar todas as promessas vãs feitas ao longo de décadas pelo marketing das emissoras.

    Os fatos obrigam a concordar. Mas, e quanto à receita publicitária nesse modelo de controle para o consumidor/telespectador? Será que as empresas vão ter de assumir uma postura mais discreta, e buscar renome e presença na TV no papel de financiadores de programas, desviando recursos dos anúncios que poucos irão ver?
    Viajei um pouco. Sinal de que o post foi feliz em propor debate. Abraço

  6. Foi mal mas não consegui ler até o fim.
    Como assim você diz que a internet é uma ameaça de mentirinha pra televisão?!
    Quão longe vai a sua ignorância?! A televisão à muito não agrada o público jovem e o pessoal mais velho que se aventura pela internet, começa a passar bem menos tempo na frente da TV.

    Faça-me o favor…

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