O que fez de errado o Quitandinha Bar (além do óbvio)?

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Queridos amigos internéticos, temos uma nova história no ciberespaço brasileiro a ser compartilhada em salas de aula e eventos publicitários.

Sem videocase, sem “a maior campanha do mundo”, em uma sequência de eventos mal sucedidos sem precedentes, a internet paulistana se viu em polvorosa com a desastrosa gestão de crise de um bar na cidade de São Paulo.

Mas o que aconteceu?

Se você estava ausente em algum retiro espiritual durante o carnaval, a história foi a seguinte: tudo começou com um post de Julia Velo sobre um assédio sofrido por ela e uma amiga dentro do bar Quitandinha, na Vila Madalena, que, segundo conta Julia, não só foi conivente, como ainda penalizou as duas moças, expulsando-as do bar, já que os ditos assediadores “eram clientes há mais de 10 anos”.

Não precisou muito para que o textão (como apelidou a própria publicadora) fosse compartilhado quase 40 mil vezes no Facebook.

gestão de crise em redes sociais

Leia o post completo no Facebook.

Não fosse o ocorrido por si só execrável (e não é intenção deste texto avaliá-lo ou acreditar ou duvidar dele), o tratamento dado pelo bar após o início da viralização da história vem coroar mais um exemplo do que NÃO fazer em uma gestão de crise nos meios sociais.

atentionReforço que a ideia deste artigo não é avaliar o ocorrido em si (o assédio, a agressão, etc) mas, como profissionais de comunicação, avaliar o impacto do desastroso gerenciamento da crise, o que permitirá levar para realidade de cada um alguns aprendizados em #comolidar.

Diversos parênteses em meio ao texto reforçam isso para que uma discussão sobre mídias sociais não vire um embate sobre outros temas.

1. A demora em posicionar-se

O crescimento de uma história é exponencial, e a velocidade de propagação faz com que o alcance e impacto sejam massivos em muito pouco tempo, principalmente quando esta história traz consigo um potencial viral considerável.

A postagem inicial da cliente foi dia 5 de fevereiro, às 15:43h. O bar não se pronunciou publicamente até o dia seguinte (6/fev) às 14:39h. Parece pouco tempo? Mas não, não é. 

Uma vez iniciado o processo de viralização (neste caso, quase que imediatamente), as 6 horas iniciais são as mais críticas para contenção de uma mensagem negativa; o que dizer de 24h de completo silêncio.

Fosse esta uma crise informacional, ou seja, caso o fato não tivesse ocorrido exatamente como conta a cliente, a partir deste silêncio a percepção passaria a ser a verdade.

2. A falta das Sandálias da Humildade

Toda história ganhou ares quixotescos quando, na primeira comunicação do estabelecimento com o público, este tentou encobrir a empatia da comunidade ao fato ocorrido, invertendo o ônus da prova e levantando suspeitas quanto à autenticidade do fato e credibilidade da cliente.

Quitandinha Bar - gestão de crise, resposta inadequada

.

E isto foi o estopim para que a história alcançasse outros níveis de exposição. Quem se revoltou (todos) com a arrogância do estabelecimento, tratou de recrutar ainda mais espectadores para esta novela da vida real.

Agora a questão do assédio era orbital frente à forma como a reclamação foi tratada pelo bar; não estava – apenas – em jogo o ocorrido, mas a infame tentativa do bar de ir contra um grupo, contra uma comunidade (“comunidade daqueles que acharam que o ocorrido foi um absurdo”).

Repercussão de resposta inadequada

Imaginemos que, na pior das hipóteses, o fato não tivesse ocorrido e Julia estivesse delirando. Mesmo assim, neste momento, a percepção já havia virado a realidade.

Uma vez formada a verdade aceita pela comunidade, não se vai contra o grupo. Nunca.

Os argumentos utilizados pelo bar para descaracterizar a acusação foram pífios e facilmente desconstruídos em uma rápida análise do discurso falacioso. Sinceramente, seria possível todo um novo artigo apenas analisando cada elemento mal amarrado desta réplica do estabelecimento.

  • O bar existe há 25 anos“. Apelo à antiguidade (Argumentum ad antiquitatem) – antiguidade não é sinônimo de credibilidade; atualmente a “tradição” perdeu espaço para a “inovação” quando se trata da admiração por marcas e empresas.
  • nunca houve uma ocorrência como esta“. Apelo à ignorância (Argumentum ad ignorantiam) – verdadeiramente, é impossível afirmar algo do gênero; e, ainda que fosse verdade, não se está julgando a quantidade de vezes que aconteceu, mas a relevância desta (única?) vez e, portanto, como o estabelecimento se posicionaria frente a isto. Mesmo marcas consolidadas mundialmente (Nestlè, Johnson & Johnson, Danone) passaram – ou passarão – por situações de crise que demandará ações efetivas.
  • O bar é frequentado por 70% de mulheres (sic)“. Apelo à multidão – ainda que isto fosse verdade, tenta provar que, ao ter muitas mulheres, tal fato não poderia ocorrer. Mais um erro categorial, pois quer aplicar uma regra para subestimar a exceção; adicionalmente, o fato é irrelevante para contra-argumentar a situação.
  • Estranha o fato da pessoa que conta a história não querer assistência“. Ataque ao interlocutor (Argumentum ad hominem) – ataque direto à idoneidade do interlocutor, o mais baixo (e fácil) mecanismo de defesa. Nos meios sociais, o grupo sempre será mais forte que um indivíduo jurídico; atacar um do grupo significa atacar o bando e, aí, a reação se dá também em grupo.

Claro que, logo após o discutível posicionamento do bar, diversas ferramentas de avaliação foram inundadas por comentários e reviews negativos.

No Facebook, TripAdvisor e Foursquare, para citar alguns, dezenas de milhares de pessoas denunciavam o ocorrido, atingindo outras tantas que, por questões geográficas, repertoriais ou de conexão social, ainda não haviam se deparado com a história.

Isto fez com que a narrativa do “misógino bar Quitandinha, de São Paulo” ultrapassasse barreiras territoriais e até quem já nunca iria no local, “nunca mais iria”. Foram mais de 60 mil avaliações “nota 1” do local no Foursquare, Facebook e Trip Advisor.

Avaliações negativas caso Quitandinha

Como lidar?

Existem algumas formas de se lidar com crises no meio digital. Primeiramente, tentar minimizar o impacto de propagação.

Um simples e imediato “estamos averiguando o que aconteceu” já serviria para ganhar um pouco de tempo enquanto efetivamente se averigua o que aconteceu. Para isto, viver na velocidade da internet (o que significa estar constantemente monitorando as reações à sua empresa e produto) é fundamental.

Na sequência, levar a tratativa do ocorrido para fora da arena pública, onde está exposto ao julgamento de milhares e, inclusive, à deturpação da história original, o que, além da crise de fato, poderia gerar novas crises informacionais.

Buscar uma solução para o alfa original (neste caso, a srta Julia) traz a esperança de que este possa voltar atrás em sua propagação. Tomando que o ocorrido foi real, o bar poderia, por exemplo, com o acompanhamento da reclamante: demitir o gerente, denunciar os assediadores às autoridades, prestar assistência às investigações e buscar uma forma de compensar o ocorrido.

Uma simples nova postagem de Julia falando “Gente, eles entraram em contato comigo e estamos trabalhando juntos para resolver” substituiria qualquer nota formulada por nem sempre preparados assessores de imprensa.

Maaaaaaas, contudo, entretanto, todavia, a sequência do que foi postado pelo Quitandinha Bar serviu para coroar a falta de tato no trato da situação:

avaliacoes-negativas_quitandinha_bar

O comentário da Thamara resume as quase 2.000 reações:

thamara

Em nenhum momento o bar mostrou fatos que contradissessem o ocorrido, nem deu um voto de confiança à narrativa para, ao menos, investigar o ocorrido. Um primeiro sinal de solidariedade, dada gravidade do ocorrido, já poderia reverter (ou, ao menos, anular) a reação inicial – e natural – de embate entre a comunidade e a pessoa jurídica.

3. #Vamos_fazer_um_escândalo

O bar fez no público o que costuma fazer na privada. Manter a discussão em aberto apenas fez com que ele tivesse que lidar não mais apenas com os envolvidos diretos na história (Julia e sua amiga), mas com milhares e milhares de pessoas que incorporaram o personagem e sentiram-se, também eles, as angústias da protagonista.

Ao que parece, em nenhum momento o estabelecimento entrou em contato com a postadora original para tentar esclarecer e/ou solucionar o ocorrido; ao invés disso, “rodou a baiana” contra “milhares de Julias”, que se solidarizaram com o ocorrido, projetaram histórias pessoais naquele caso, sentiram-se ultrajados pela ignorância em discutir ao menos a “eventual possibilidade do provável” assédio.

Na verdade, nem todos eram #jesuisJulia; uma boa parte revoltou-se tanto ou mais com o discurso reativo do bar que com o assédio em si. Claro que, com a questão do assédio como fundação para a argumentação, não haveria a menor possibilidade de existir uma polarização na discussão. O bar é mau, e ponto.

O bar Quitandinha atirou a primeira pedra em seu próprio teto de vidro e, a partir daí, o que se viu foi uma chuva da “granito” vinda de todos os lados. Sim, isso virou um escândalo. E quando o circo se arma “na internê”, os abutres midiáticos empunham seus estandartes a favor do exército que está vencendo.

quitandinha-buscadores

A história ganhou a mídia de massa; a posição arrogante do bar tornou-se uma verdade absoluta até para quem não tinha a menor ideia nem de sua existência.

E, assim, uma marca é desconstruída, criando-se a percepção negativa que será perpetuada por um bom tempo, não só graças aos indexadores dos mecanismos de busca (Google e afins) nas inúmeras matérias publicadas a respeito, mas no repertório e na cultura popular de quem, de alguma forma, foi (e ainda será) impactado pelo ocorrido.

As marcas se perpetuam pelas histórias que as pessoas contam. E que história temos aqui? [Webinsider]

…………………………

Leia também:

JC Rodrigues (@jcrodrigues) é publicitário pela ESPM, pós-graduado pela UFRJ, MBA pela ESPM. Foi professor da ESPM, da Miami Ad School e diretor da Disney Interactive, na The Walt Disney Company.

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4 respostas

  1. Cara Nilmara,

    Pelo o que vejo você está generalizando e rotulando as pessoas que participaram do boicote, além do que não faz idéia do que significa ser feminista.
    Então antes de sair falando besteiras como assim fez o bar, estude um pouco e agrida menos.
    Se você puder pensar um pouco mais além do seu normal, e pesquisar um pouco, 90% das mulheres que sofrem abuso (seja qual for) não denunciam o agressor. O que não foi o caso das duas. Elas tentaram denunciar e a própria PM que atendeu o caso na hora deu crédito aos dois rapazes.
    Os amigos delas que estavam no local tentaram intervir e foram expulsos também.
    Mas o que eu mais quero falar aqui não é sobre o caso em si, que eu defendi o boicote sim, não por ser feminista ou por ser mulher, mas por ser HUMANA e perceber que nenhuma mulher se colocaria em uma situação de humilhação desse tamanho sem nenhum motivo.
    O que eu gostaria de falar é que você não entendeu nada do ponto dessa matéria que era discutir o fato de o Quintantinha Bar ter feito TUDO ERRADO para tentar resolver a situação.
    Recomendo que você releia a matéria focando no ponto do JC Rodrigues e no que ele disse.
    Se quiser discutir sobre certo e errado, dar sua opinião sobre o que houve no local e sobre as mais de 40mil pessoas que se uniram para fazer justiça, por favor, vá para um local apropriado.

    ————-

    JC Rodrigues, MUITO bom seu texto! Fui profissional de Marketing por 6 anos e hoje atuo em outro mercado.
    Mas nessa minha trajetória pude ver que realmente as empresas precisam focar mais nas redes sociais pois sendo mal geridas as questões de crise realmente podem acabar tendo um efeito muito maior do que precisava.
    Obrigada pelo texto claro e conciso.
    Abs,
    Rita

  2. Feministas e feministos são todos um bando de zumbis que sem ao menos checar se a história é verdadeira ou não saem falando merda e como oc~e bem disse: pessoas que nunca iriam ao local dizem hoje que nunca iriam. Um bando de idiotas que embarcam numa história totalmente sem noção. Como é que uma pessoa que se diz vítima não faz B.O. e nem ao menos tona que tava com os braços cortados!!!??? E kd esses amigos que não socorreram essas mulheres desprotegidas. Senta lá Claudia!!!

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