Ella Jane Fitzgerald, a voz mística do Jazz

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on telegram
Share on pocket

Ella Fitzgerald foi uma voz que me mistificou quando ainda adolescente. Sua contribuição ao Jazz perdura com brilhantismo até hoje, e houve um momento em que eu deixei a explicação sobre o fascínio de lado, para aceitar e apreciar a sua presença musical e tudo de bom que ela gravou.

 

Quem pode explicar o sentimento de alguém, frente a alguma coisa que lhe emociona? Pois bem, na minha adolescência, já muito envolvido com os discos de Jazz, eu comprei o álbum Whisper Not, gravado para a Verve em 1966, com a participação do excelente arranjador Marty Paich.

A cantora, Ella Fitzgerald, me deixou intrigado. Como era possível uma voz daquela vir de alguém com tanta virtuosidade, sinceridade e beleza? Os arranjos lhe favoreciam, mas não era essa a explicação que eu estava procurando.

Anos mais tarde, eu soube de uma fofoca a respeito de Norman Granz, produtor da Verve, que teria sido acusado de favorecer e dar mais apoio a Ella Fizgerald, ao invés de outras cantoras, que assim estariam sendo injustiçadas na gravadora. Se ele de fato fez isso, eu então não fui o único a fazer isso também! Se uma explicação não é possível arrumar, a melhor opção é deixar tudo de lado e apreciar aquilo que nos fascina!

Quando, na década de 1990, foi aberto o fórum da Verve, eu me inscrevi por lá e comecei a questionar porque várias gravações nunca haviam saído em CD, formato que já estava no mercado fazia anos.

A Verve, depois da insistência de muitos participantes daquele fórum, resolver lançar uma série de discos com o rótulo de “Verve By Request”. Uma das agradáveis surpresas foi o lançamento do meu antigo disco favorito “Whisper Not”. A música do título do disco foi composta pelo brilhante saxofonista Benny Golson, para a trilha do filme francês de 1959 “Des Femmes Disparaissent”.

Para o lançamento, ao invés do tradicional estojo, o CD foi oferecido em uma daquelas capas simuladas de elepês. Uma tarja lateral avisava que a edição do disco só estaria disponível até “Maio de 2005”. Claro, que quem soube do disco já tinha corrido para comprar, no meu caso importar, porque a reedição nunca foi, que eu saiba, lançada por aqui. A remasterização foi caprichada, já em uma época em que as gravadoras passavam a fita analógica para uma master digital a 96 kHz e 24 bits.

 

Eu não sei porque a Verve custou a relançar Whisper Not, porque outros discos anteriores já tinham sido remasterizados. Dois deles, por acaso, foram os discos que eu comprei em sequência, no início da década de 1990. Ella gravou com arranjos do maestro Nelson Riddle.

Um dos discos, que eu gostava mais de ouvir, lançou alguns standards com arranjos envolventes, com o nome “Ella Swings Gently With Nelson”. O outro, gravado nesta mesma época, foi de um Jazz mais “quente”, com o título “ELLA swings brightly with NELSON”.

 

Os concertos da cantora no mundo todo

Quando Ella veio ao Brasil e foi ao Theatro Municipal do Rio de Janeiro para dar um concerto com o seu trio da época, o The Tommy Flanagan Trio, eu pedi uma grana para a minha mãe e saí correndo para comprar um ingresso, aliás no lugar mais alto e distante do palco, porque era o que dava para pagar. Ainda bem que eu enxergava direito…

Eu me lembro agora que o concerto se deu no começo da década de 1970, acho que meio de 1971. Foi comigo um amigo de infância, igualmente fã da cantora. O teatro estava lotado, alguém gritou pedindo que ela cantasse “People”, e ela, muito gentilmente, se revelou espantada, e falou “People?”, mas cantou assim mesmo.

Para mim, pessoalmente, foi o fim da picada, felizmente compensada amplamente pelos scat singings brilhantes, que ela não se furtou a improvisar na frente da plateia.

Certas coisas acontecem por acaso: eu estava fazendo um pseudo estágio na sala de corte da Polygram, quando apareceu por lá a fita master da gravação Ella in London, produção de Norman Granz (quem diria…) para a Pablo, aliás, fundada por ele.

A caixa com a fita tinha um adesivo dizendo “Dolby A”, redutor de ruído muito usado nesta época. O técnico fez o alinhamento da fita com o decodificador Dolby desligado, e quando eu perguntei se ele não devia usá-lo, ele me responde que estava com defeito. Claro que eu nunca comprei aquele elepê, sabendo de antemão que fora cortado errado. E parece que ninguém lá notava.

O envolvimento de Ella Fitzgerald com a Bossa Nova

Ella, volta e meia, interpretava alguma música nos seus concertos, para os “fãs da Bossa Nova”. Fez isso, por exemplo, cantando “The Boy From Ipanema”, no disco da Verve “Ella in Hamburg”, de 1965.

Quando o disco Ella Abraça Jobim foi lançado, eu me vi ali diante de dois dos meus grandes ídolos. Infelizmente, para mim o resultado foi decepcionante. A lista de músicos foi generosa, mas os arranjos me pareciam adulterar a essência lírica das músicas do Tom. Muita gente gostou, o meu disco ficou na prateleira,

Músicos norte-americanos e alguns europeus também deixaram de respeitar a estrutura original das composições do Tom e de outros notáveis compositores, cuja obra tinha tido sucesso no exterior. Isso aconteceu desde o início, e eu percebia que era uma obsessão com a improvisação em torno da melodia. Algumas dessas interpretações deram certo, mas outras não, a não ser que a gente esquecesse que estava ouvindo Bossa Nova.

Declínio de carreira, com doenças incuráveis

Infelizmente, Ella Fitzgerald teve um final de vida muito penoso. Sequiosa de continuar cantando e dando concertos, ela não conseguiu se manter ativa, porque a sua condição de diabética a deixou com várias doenças recorrentes e respectivas sequelas, e no final, ela foi obrigada a amputar ambas as pernas, muito triste. A visão também se deteriorou muito, obrigando-a a usar óculos com lentes fundo de garrafa.

Depois de uma série de incidentes clínicos nos seus últimos anos, Ella faleceu em junho de 1996, com 79 anos. A sua morte chocou seus fãs e seus colegas de profissão.

Foi, de qualquer maneira, uma carreira exemplar, ao lado de grandes músicos, vencendo a sua natural timidez quando subia nos palcos. Estrelou no filme “Pete Kelly’s Blues” (no Brasil, “Taverna Maldita” ), de 1955, mas não fez carreira como atriz, o filme ficou só na lembrança dos fãs.

 

 

A coisa mais importante para qualquer músico ou compositor é deixar um legado para a posteridade. Ella Fitzgerald deixou em nós uma marca inconfundível, que nos acompanhou a vida toda. Eu dei sorte de vê-la no palco, e os seus discos foram referência do que de melhor até hoje existe no Jazz vocal. Outrolado_

 

. . .

Louis Armstrong, o menino de origem humilde que reinventou o Jazz

 

Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim

 

O interesse pelas gravações analógicas estereofônicas originais

 

Muito à Vontade, de João Donato, é uma joia da Bossa Nova

 

Gravação antigas de rock: do som mono ao multicanal

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on telegram
Share on pocket

Mais lidas

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *