De-Lovely: como degradar um gênio da música

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Fui rever, a pedidos, De-Lovely, filme de 2004, que, além de não fazer justiça ao grande compositor Cole Porter, ainda o coloca debaixo de um holofote crítico por conta das suas escapadas homossexuais, ao invés da sua obra criadora.

 

Um dia desses, uma pessoa da família me pediu para passar o filme de 2004 “De-Lovely”, dirigido por Irwin Winkler, com roteiro de Jay Cocks. O disco estava encostado na prateleira, fazia tempo. E eu, ao rever o filme, me lembrei por quê!

Quando se compra, como colecionador e/ou cinéfilo, um determinado filme em disco que se acaba não gostando muito, ele termina encostado sem ser mais visto, em algum lugar. De-Lovely parecia que se propôs a ser um filme biográfico. E eu, desnecessário dizer, sou muito fã da música de Cole Porter. Quer dizer, vi o filme por causa da música, e não gostei, ficou por isso mesmo.

Existem múltiplas maneiras de alguém analisar a personalidade dos outros, uma delas quando se vê as virtudes daquela pessoa, e outra, quando se tenta achar defeitos e falhas de caráter da pessoa analisada.

Cole Porter foi um grande compositor, as letras que ele escreveu exemplares e muito bem descritivas, com imagens belíssimas. Ele foi um daqueles músicos cuja inspiração e trabalho árduo lhe permitiram fazer suas músicas se encaixarem perfeitamente nas peças de teatro que ele iria criar.

Mas, ele tinha um lado social complicado. Casou-se com Linda Lee Thomas, mulher divorciada de um marido abusivo, que encontrou em Porter a razão de estar novamente ao lado de um homem a quem admirava. Aparentemente, ela sabia das relações homossexuais do compositor, mas teria declarado que ela aceitaria o que ele vinha fazendo, bastando somente ser discreto!

A homossexualidade masculina sempre foi malvista pela sociedade, não importa o que declaram hoje os movimentos a favor das relações homoafetivas. Desde que eu me entendo por gente, eu vejo a discriminação agressiva perpetuada contra aqueles que não se encaixam nos padrões hipócritas da sociedade. No colégio secundário que eu frequentei, Católico Marista, e somente para meninos, havia um estudante que era totalmente efeminado. Aguentou o que pode e depois saiu do colégio. São adolescentes como estes que sofrem horrores durante a fase de formação de suas vidas, e, é claro, isso tem consequências traumáticas para o que ainda vem por aí.

O filme de Irwin Winkler concentra a sua visão de Cole Porter na sua vida homoafetiva, e não na sua produção musical. Neste quesito, que seria de suma importância, ainda comete a imprudência de colocar em ação cantores notórios, como Elvis Costello, Diana Krall, Alanis Morissette, Natalie Cole, etc., intérpretes sem nenhuma história com o compositor.

Kevin Kline, porém, que interpreta Cole, tem formação de piano, e não foi uma má escolha para o papel. Ashley Judd interpreta Linda com sobriedade, e o infatigável Jonathan Pryce como o anjo Gabriel, que irá guiar Cole por toda a sua trajetória.

Algumas cenas merecem ser vistas. Por exemplo, quando Cole e Linda vão parar em um café ao ar livre, onde ele acha um piano, toca e canta para ela a belíssima “You’d Be So Easy To Love”:

Outra cena meritória é quando Cole encontra Louis B. Mayer na M-G-M e faz dele todo tipo de troça, cantando e dançando “Be A Clown”:

 

A cena é proposital. Louis B. Mayer era um déspota ganancioso, destruiu a vida de muita gente na M-G-M, seduzia quem trazia mais dinheiro a ele e intimidava quem o contrariava.

Be A Clown foi usada no filme O Pirata, de 1948. Mas, em 1952 Arhur Freed e Nacio Herb Brown lançaram “Make ‘Em Laugh”, em Cantando na Chuva, plagiando descaradamente Cole Porter.

Este não foi o único filme a criticar Louis B. Mayer, mas claramente foi o que o fez com muito bom humor.

É uma pena que o conjunto do roteiro de De-Lovely estivesse propenso a denegrir a imagem de Cole Porter. A inserção de cantores do momento dá a impressão de que o filme foi feito para vender a música de Cole Porter, mas nunca para homenageá-la.

Cole Porter, o músico criador e compositor notável, merecia não ser desclassificado em público dessa maneira!  Outrolado_

. . .

Cole Porter, um gênio da música popular norte-americana

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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