Peter Bogdanovich, um ator-cineasta que amava os cineastas clássicos e o cinema

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Peter Bogdanovich foi ator, autor, jornalista, cineasta e profundo admirador de grandes cineastas do passado

Falecido no ano passado, Peter Bogdanovich fez de tudo: ator, autor, jornalista, cineasta e profundo admirador de grandes cineastas do passado, entre eles Orson Welles, que foi prejudicado várias vezes pelo sistema.

 

Peter Bogdanovich, falecido em janeiro de 2022, por complicações recorrentes da doença de Parkinson, era franco e declarado admirador dos cineastas clássicos, do melhor que Hollywood ofereceu ao público, em épocas distintas. E sobre eles escreveu ensaios, matérias em revistas e jornais, e livros. Também realizou documentários, um deles que eu assisti na filmoteca do Consulado Americano, e depois reeditado por ele, sobre John Ford. Este documentário foi compartilhado no YouTube, com boa imagem:

Também no YouTube o cineasta aparece em gravações com depoimentos, feitas em alguns dos eventos dos quais participou. Um deles, se alguém tiver paciência para assistir toda a sua história, está aqui:

São 2 horas de conversa, que cobrem o início, a vida do cineasta e a sua interação com os ídolos que ele admirava.

A primeira vez que eu assisti Bogdanovich no cinema foi na comédia “What’s Up, Doc?” (no Brasil, com o título idiota “Essa pequena é uma parada”). O filme no seu lançamento teve grande apelo popular. O roteiro, segundo ele, super alterado, é uma compilação da comédia pastelão clássica e dos cartuns da Warner Brothers.

Talvez, por coincidência, a sua convivência com o animador e cineasta Frank Tashlin tenha sido determinante na elaboração de cenas que lembram muito as gags dos desenhos da Warner. O próprio título é uma referência à gag criada por Tex Avery para os desenhos do Pernalonga, quando o personagem interpela os seus antagonistas. Se alguém pudesse ter dúvidas a este respeito, basta assistir o fim do filme. Aliás, a propósito, o aplicativo “WhatsApp” também é uma referência daquela frase/pergunta. Talvez a melhor tradução da frase dita nos desenhos seria “O que é que há, Doutor?”.

Bogdanovich viria, tal como seu ídolo John Ford, usar os mesmos atores, em vários filmes. Por exemplo, Ryan O’Neal aparece em “The Last Picture Show”, de 1971 e “Paper Moon”, de 1973, neste último filme com a sua filha Tatum O’Neal, que também está em “Nickelodeon”, de 1976.

O assunto “cinema” é recorrente em alguns desses filmes. Na realidade, Bogdanovich era egresso da crítica de cinema. Por coincidência, escreveu no Cahiers Du Cinéma, onde os cineastas da Nouvelle Vague também começaram como críticos e estudiosos de cinema, antes de dirigir filmes.

É bastante provável que Peter Bogdanovich tenha assimilado a essência do cinema de autor ao escrever livros e/ou conviver com cineastas clássicos, como Howard Hawks, John Ford, Alfred Hitchcock, entre outros, e com Orson Welles, figura icônica do cineasta revolucionário que Hollywood colocou propositalmente de lado.

Peter fez um esforço para recuperar o que sobrou do último e inacabado filme de Orson Welles, exibido no Netflix. E este esforço não deixou de ser mais um dos vários tributos que prestou ao injustiçado cineasta, que ele tanto admirava.

Até o final da sua vida, Peter Bogdanovich demonstrou o seu apego e admiração pelo cinema, como uma das mais importantes formas de comunicação do século passado. Visto como pretensioso por alguns, ele, até onde eu sei, nunca deixou de se auto rotular como aprendiz do que os outros fizeram. E se espelhou no que ouviu dos cineastas clássicos para decidir como fazer os seus filmes. A sua formação original como ator provavelmente o teria ajudado a fazer isso mesmo.

Se pretensioso ele foi, pelo menos não deixou de destacar as suas auto críticas, por ter feito filmes que ficaram muito abaixo do que ele desejava. Todo grande cineasta teve seus momentos de infelicidade no trabalho, alguns, que não são tão grandes assim, revisaram ou remontaram os filmes que acharam que não tinham a qualidade que queriam.

Peter Bogdanovich fez isso com o filme musical “At Long Last Love” (no Brasil, Amor, Eterno Amor), baseado em Cole Porter. Nem a versão remontada ele achou satisfatória, mas no final foi a Fox quem remontou tudo de volta, e ele acabou finalmente gostando do filme, que saiu em home vídeo.

Mas, é assim mesmo: quem cria, revisa, porque as revisões corrigem falhas do momento da criação. O importante é que, no final, se possa errar o mínimo possível. E esperar que o que foi feito tenha um bom destino.

Quando perguntado sobre o que ele acha do cinema atual (na época da entrevista, vista no vídeo acima) ele diz que os filmes ficaram exageradamente violentos. Além disso, ele critica a construção de narrativas com saltos no tempo, na opinião dele, desnecessários e repetitivos, ao ponto de serem parte de uma linguagem manca.

Aí fala o crítico e não o diretor. Eu, pessoalmente, concordo totalmente, e vou mais além: acho chato ver os estúdios repetirem o mesmo enredo duzentas vezes, na tentativa de ganhar mais dinheiro. Lógico que o problema não está em faturar mais, mas sim adulterar o que de bom teve o filme original repetido.

Por exemplo, se Star Wars, mesmo com as suas limitações, teve méritos históricos, e deu a chance de contar o resto da estória em duas produções subsequentes, acabou por se tornar monótono e sem conteúdo quando se começou a usar personagens do antigo filme em novos roteiros.

Idem para Jurassic Park. O terceiro filme da trilogia original já é bastante fraco. As críticas à manipulação e violentação da natureza estão no primeiro filme, o resto não se detém em nenhuma delas.

Ao longo da sua vivência, Peter Bogdanovich fez o que o bom senso lhe mandava: olhar os antigos cineastas com olhos críticos e descobrir por que eles foram inovadores. Depois, seguir nesses passos, para aprender e construir roteiros e filmes que mostram o que ele assimilou, e com os seus filmes não só prestar homenagens, mas também inovar ou contribuir de alguma maneira. [Webinsider]

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Tex Avery, o maior gênio do cinema de animação

 

O último filme de Orson Welles

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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