O cinema Super Bruni 70, no Rio de Janeiro, serviu de palco para uma apresentação do icônico músico de Jazz Dizzy Gillespie, e eu e a Silvia Rabello estávamos lá para testemunhar aquele evento.
Em um artigo publicado no ano passado pelo Webinsider/Outro Lado, sobre educação musical, com o título “O Jazz Nosso de Cada Dia”, eu fiz um relato detalhado sobre a minha iniciação pessoal por um gosto musical mais sofisticado do que a musica comercial que eu ouvia durante boa parte da infância e início da adolescência.
Aconteceu que, na década de 1970, quando eu ainda era estudante universitário, Dizzy Gillespie se apresentou no cinema Super Bruni 70. Eu fui lá com a Silvia Rabello, minha companheira de filmes e música daquela época. Chegando lá, achamos uma multidão intransponível de gente querendo entrar no cinema, e eu cheguei a achar que não íamos conseguir entrar lá dentro. Mas, a Silvia, muito mais esperta do que eu, achou uma brecha em um lado da corda que impedia as pessoas de entrar, e falou “vem comigo”. Chegou a ser cômico, mas entramos e conseguimos um lugar perto do palco improvisado.
Em um dado momento, Gillespie se retira, deixa os outros músicos tocando, vai para atrás daquele palco e começa a fumar um baseado. Nós dois vimos, e achamos divertido. O hábito de fumar maconha, antes ou durante o concerto, neste caso, é antigo nos músicos de Jazz. Louis Armstrong fumava maconha antes dos shows ou gravações e começava a dizer, já meio alucinado, “estou pronto, estou pronto” e saía tocando.
Drogas sempre acompanharam vários grandes músicos. A minha professora de Farmacologia na Faculdade nos dizia que certos estimulantes aumentam a acuidade auditiva dos músicos, daí o provável motivo do uso deste tipo de droga.
A história do cinema
Aquele show no Super Bruni ficou para sempre na minha memória, mas infelizmente não se acha nenhum registro daquele evento, se existe eu não conheço. O prédio era localizado na Rua Visconde de Pirajá 595, em Ipanema, onde o cinema ficava. que tem um histórico rico:
No seu lugar, funcionou por anos a fio o Cinema Astória, que fechou as portas em 1963. A seguir, o recinto foi ocupado pela TV Excelsior, canal 2, que realizou ali a maior parte dos shows da rede.
Com a cassação pela ditadura da TV Excelsior, em 1970, o prédio ficou vazio por um tempo, e reabriu em 1971, como Super Bruni 70, durante a febre dos filmes projetados em 70 mm na cidade.
As imagens abaixo, colhidas on-line, dão uma ideia da frente do cinema e do auditório:
O Super Bruni foi equipado com projetores Incol 70/35, assim como outros cinemas da cadeia do exibidor Livio Bruni. Embora o auditório fosse razoavelmente amplo, não era nada demais. Comentando sobre o cinema, o Orion Jardim de Faria, que instalou seus projetores lá, me disse que o cinema de “super” não tinha nada!
Entretanto, quem promoveu o aparecimento do Dizzy e da sua entourage, conseguiu improvisar um pequeno palco, onde o músico e seus colaboradores se apresentaram, aliás, com grande sucesso!
Para mim, e creio que para a Silvia também, foi uma chance imperdível de ver de perto um músico que marcou época, durante o aparecimento do Bebop, gênero que ele se achava criador, junto com Charlie Parker, que achava a mesma coisa.
O meu primeiro elepê do Dizzy Gillespie foi o da gravação da Philips “Something Old, Something New”, de 1963. O elepê era mono, e eu passei anos tentando achar a versão em CD. agora no original estereofônico e muito bem remasterizado. O seu tenorista James Moody, eu consegui ver de perto no Festival de Jazz de Brecon, por volta de 1993. Pura sorte!
O prédio do Super Bruni, segundo soube, foi demolido após o seu fechamento em 1976, e deu lugar a um edifício de escritórios. Típico! [Webinsider]
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.