Regras, metas e ética: do board às camadas mais baixas

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Grandes corporações precisam de regras e metas para garantir que seus milhares de funcionários não botem fogo nas cortinas.

Mas quando a empresa não tem ética, ela é formada por ? vejam só que coisa ? profissionais sem ética. Nestes lugares, regras e metas servem apenas para ser burladas em benefício próprio.

Um exemplo são as regras que impedem contratações mesmo com o aumento de trabalho. Medida lógica e até interessante para enxugar a empresa, apesar da aparente impossibilidade de ser burlada, sempre é possível dar um jeitinho.

A empresa não pode contratar ninguém, mas tem verbas para gastar durante o ano com seus fornecedores. Então existe verba para os projetos, mas falta mão-de-obra para executá-los dentro da empresa. A solução é simples, utiliza-se parte da verba do projeto para contratar alguém. Como isso é burocraticamente impossível, o funcionário novo é registrado pelo fornecedor. Usando o exemplo do nosso mercado, ele seria contatado pela agência.

Para não ter prejuízo, o fornecedor adiciona seu overhead, encargos trabalhistas e mais duas outras coisas: risco e lucro. Com risco quero dizer receber antes os valores de uma eventual quebra de contrato que envolveria outros encargos trabalhistas. E assim, o valor deste profissional sai mais caro para a empresa fora do que dentro. O projeto perde parte de sua verba (o que é outra conseqüência desastrosa) e surge um novo tipo de profissional, o cachorro com dois donos. No nosso exemplo, o dono agência e o dono anunciante. Uma história que raramente funciona direito.

Alias, as fortes restrições contra o aumento do overhead, contratações e o medo das demissões também tem efeitos colaterais de longo prazo. O responsável por uma equipe não pode contratar ninguém e acaba ficando com uma equipe enxuta demais para cuidar do volume de trabalho. Então, com medo de perder um profissional que não será reposto, faz avaliações positivas de todo mundo, mesmo daqueles que são medíocres.

Um profissional medíocre pode receber várias avaliações positivas em seqüência. E como nas grandes empresas as avaliações são levadas a sério, o resultado é fácil prever. Se um dia a mediocridade se tornar insuportável, será difícil mandar o incompetente para a rua. Como explicar que um cara com tantas avaliações positivas se tornou imprestável de uma hora pra outra?

Mais provável que ele seja promovido. Aliás, esta é a ?melhor? parte. Para se livrar do medíocre, não é raro nestas empresas que o chefe recomende-o para uma promoção em outro departamento.

Não é diferente com as metas. Como departamentos não podem responder pela eficiência de outros, boa parte do bônus é avaliado em metas indiretamente ligadas ao objetivo da empresa.

Quem já não viu isso acontecer? O diretor precisa montar um cadastro com 300 mil clientes e para isso faz aquela velha e boa promoção de ?se inscreva e concorra a um carro?. A meta é alcançada com um banco cheio de pessoas completamente fora do perfil do consumidor da empresa. Gente que cadastrou até o cachorro e papagaio para concorrer ao prêmio mas que nunca irá comprar o produto da empresa.

Talvez o melhor exemplo esteja no livro A Arte do Planejamento, de Jon Steel. Na época de Stalin, as fábricas que fabricavam prego receberam ordem para dobrar sua produção. Como era difícil contar pregos, o resultado seria medido pelo peso. Uma fábrica de pregos soviética não teve dúvida, passou a fazer pregos bem maiores (e claro, mais pesados). Bateu sua meta mas nenhum de seus pregos pode ser utilizado por estarem completamente fora do padrão.

Metas e regras são criadas por vice-presidentes distantes do dia-a-dia e das camadas mais baixas da hierarquia. Para estes senhores, cito o matemático Dr. Ian Malcolm, um especialista na teoria do caos com muita credibilidade em Los Angeles. Dr. Malcolm citou certa vez:

A natureza encontra um jeito!

Por seus trabalhos fracassados (em sua outra encarnação) com clonagem humana, Dr. Malcolm acabou desacreditado, mas devia ser levado a sério. O board pode achar difícil burlar estas regras, mas tem sempre um esperto dando um jeitinho, mesmo que isso prejudique a empresa. Se a empresa não é ética, é este tipo de profissional que ela atrai para seu quadro de funcionários.

É por isso que empresas e profissionais éticos precisam ser reconhecidos e respeitados. Eles existem e são eles que fazem valer a pena continuarmos tentando fazer o melhor trabalho, assim como aquilo que acreditamos ser o certo. [Webinsider]

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O livro O marketing depois de amanhã, de Ricardo Cavallini, está disponível para download.

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Ricardo Cavallini é profissional de comunicação interativa, autor do livro O marketing depois de amanhã.

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2 respostas

  1. Ótimo artigo…

    Lembro-me de uma vez onde na empresa que eu trabalhava houve um aumento de produção em cerca de 25%. Pensei que iam contratar mais gente para dar conta, no entanto, cortaram foi cabeças… Várias. 15 pessoas foram para a rua da amargura…

    E nós, os que ficamos, ganhamos trabalho. Muito trabalho.

    Abraços e até mais
    Monthiel

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