“Unboxing”: o strip-tease dos produtos

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Unboxing quer dizer: produtos desembalados no YouTube deforma semelhante aos strip-teases das vedetes dos antigos teatros de revista.

Unboxing quer dizer: produtos desembalados no YouTube de forma semelhante aos strip-teases das vedetes dos antigos teatros de revista.

 

Quando alguém compra alguma coisa e quer ver o que vem dentro da caixa, o YouTube é o site de preferência. Idem, se existe alguma incerteza de como o produto desejado vem embalado e/ou como fazer a retirada dele da caixa.

Até aí, nada demais. Mas, existe, até certo ponto, uma patologia nesta visualização, exibida com detalhes em vários canais do YouTube. Aparentemente, quem cria o vídeo sabe disso, e não se prende ao ato puro e simples de desembalar. Ele ou ela desembalam as caixas de forma bem lenta, criando um certo suspense, parece que proposital, em quem está assistindo.

Ora, por esses dias de Natal, eu dei à minha neta de 5 anos um presente que ela queria. Ao receber, ela rasga a embalagem toda imediatamente, porque o objeto de desejo estava contido lá dentro, e ela obviamente não queria perder tempo desembalando o presente de forma cuidadosa.

É bem possível que o mesmo sentimento aflore em quem assiste um vídeo nitidamente manipulador de alguém fazendo corpo mole para mostrar o que está lá dentro! Chega-se ao ponto de o autor do vídeo começar a desembalar a partir da caixa de papelão da loja onde ele ou ela compraram o produto, para só depois, lentamente, revelar o conteúdo.

O ato da desembalagem passa então por um ritual cênico que emula o antigo strip-tease dos teatros de revista, quando a vedete tirava a roupa aos pouquinhos, escondendo as partes do corpo que a plateia estava ansiosa para ver.

Se alguém acha que eu estou exagerando, eis aí em baixo um canal que eu achei com este tema:

O dono do canal sugere que o “unboxing” faça parte de um processo terapêutico, ao mesmo tempo em que ele explicitamente anuncia que os produtos vão ficar “nus”!

Neologismos e anglicismos

Quando a microinformática começou a aparecer, os teclados CP/M estavam cheios de siglas e acrônimos que quase ninguém sabia do que se tratava.

Pois bem: não tardou muito tempo e acrônimos como “Del”, “Ctrl”, etc., começaram a ser identificados e logo depois palavras como “Deletar”, ao invés de “Apagar” passaram à literatura do computes. Outras, como “Escape” (Esc) ou “Control” (Ctrl) nem tradução tiveram, talvez pela dificuldade de aportuguesar estes termos.

A microinformática foi um bom exemplo da preguiça das pessoas em falar a língua de forma correta, e é assim que neologismos são criados, de modo a simplificar tudo.

E como a língua inglesa acabou se tornando padrão no mundo inteiro, os anglicismos tomaram conta de um vocabulário usado até mesmo por pessoas mais simples ou menos educadas.

Um tempo atrás eu tomei um susto quando alguém me pediu um “print” de uma tela do celular, e o ignorante que sou só foi entender que “print” não se refere à impressão e sim à captura de uma imagem. Não teria sido mais simples pedir para capturar, ao invés de “printar”?

Pois na informática antiga, alguns usuários falavam em “printar”, quando queriam imprimir alguma coisa. E na tecnologia dos mainframes se usava “job” como sinônimo de impressão.

Se a conversa fica restrita entre pessoas do ramo, a repercussão dos anglicismos não causa grande problema, mas quando se chega ao ponto de se usar expressões que nunca existiram, a coisa toda fica confusa, como, por exemplo, “fulano está on”, muito usado para jogadores de futebol de uns tempos para cá.

A manipulação visual

A linguagem criada por Hitchcock para os filmes de suspense mostra claramente que o maior suspense visual é fruto de uma manipulação de imagens onde a plateia não consegue ver claramente o que está se passando. Hitchcock deu aulas de como o suspense pode ser criado visualmente!

No YouTube a manipulação de imagens começa na tela escolhida para anunciar o conteúdo do vídeo. É impressionante como se falsifica conteúdo. Quem assiste nunca irá ver no conteúdo do vídeo a imagem que o anuncia.

Mais impressionante ainda é quando o vídeo é narrado e o assunto que se deseja ver ou ouvir só aparece no fim! Quando um vídeo desses é longo, chega a ser irritante. Nas relações interpessoais, se alguém ficar ouvindo o seu interlocutor muito tempo sem chegar a falar o que se deseja ouvir, este ouvinte ficará igualmente irritado! É claro que quem assiste um vídeo longo e sem o conteúdo prometido e depois fica irritado só pode entrar na área de comentários e reclamar, o que não resolve absolutamente nada.

Quem assiste cinema de forma a conseguir entender como um roteiro é feito terá muito mais facilidade de perceber quando as imagens, e porque não dizer junto com a narrativa, são manipuladas de propósito.

No YouTube, a única solução viável é pular fora, e tentar achar algum canal que seja informativo e sem manipulação, dentro do mesmo assunto. Felizmente, existem pessoas que, de fato, querem compartilhar experiência e conhecimento. Esses sim, são vídeos muito bem vindos.

A Internet foi criada como um super veículo mundial de comunicação e troca de mensagens, e como tal permaneceu enquanto restrita ao meio acadêmico. Quando aberta ao restante de usuários, o comércio tomou conta, o que, em princípio, não foi ruim ou errado, mas em cima dele apareceram os oportunistas de plantão, e até hoje eu sou um que não vejo solução para isso nem a longo prazo!

O que significa que nós todos ainda vamos ouvir que o fulano está on e que alguém precisa que você envie um print de qualquer coisa. Ature quem puder… [Webinsider]

 

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Um Corpo Que Cai, a obra prima de Hitchcock, em 4K e HDR

Os produtos estão dando lugar às experiências

Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.

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