Já foi o tempo em que as notícias ficavam nas mãos das emissoras, mas hoje, qualquer um portando um telefone celular pode mudar esta realidade.
Depois que os telefones celulares ofereceram câmeras sofisticadas aos usuários, qualquer um é capaz de gravar ou fotografar qualquer coisa, inclusive com resolução de até 4K e HDR. Tal recurso transforma o cidadão comum em um jornalista amador, e por isso não é de se espantar que emissoras de TV incentivem pessoas a fazer isso em meio a reportagens diversas.
Reparem que este incentivo permite às emissoras poupar grana e tempo com a locação de repórteres, mas existe um efeito negativo envolvido, agora incontornável: qualquer um pode criar um canal de TV na Internet, e neste caso o principal veículo não é a emissora e sim o YouTube.
Ao contrário das emissoras, um canal do YouTube não precisa de concessão para funcionar Ele é propriedade e responsabilidade de uma pessoa ou de seu grupo. Em muitos casos, as notícias nestes canais são fruto do canibalismo jornalístico, isto é, elas são uma cópia pura e simples dos textos ou vídeos de outras pessoas. Como se trata de uma citação, creio que não há infringência de direito autoral. Se houver, o YouTube bloqueia. E, mais importante ainda, os comentários ou vídeos citados ficam abertos a críticas!
Não há como competir, e neste último desastre ocorrido nas enchentes lamentáveis no Rio Grande do Sul, quem quis passar pano (expressão da moda) nas omissões oficiais, e culpou vídeo bloguistas de alarmistas portadores de notícias falsas (coisa da moda também), acabou se ferrando, mostrando assim evidências de um jornalismo pueril, sem pesquisa, sem cuidado, e sem esconder a sua tendenciosidade política!
O histórico de uma rede de TV controversa
Eu era um jovem adolescente, quando a TV Globo do Rio de Janeiro, canal 4 VHF, entrou no ar, circa 1965. Tratava-se de uma emissora super moderna, desde os estúdios no Jardim Botânico até os transmissores. Câmeras RCA TK 60 garantiam a qualidade das imagens.
O então colunista do jornal O Globo, Artur da Távola, sempre crítico dos programas de TV, escreveu que a TV Globo iria elevar o nível de qualidade da programação, elemento que sempre faltou às concorrentes. De fato, logo nas transmissões experimentais, a TV Globo exibia filmes de concertos de música clássica. E ao inaugurar, a emissora prometia fundos e mundos de programação de alta qualidade. Mas, com isso arrumou um problema: o nível de audiência era muito baixo. A emissora aparentemente se esqueceu que a maior parte do público não era o da plateia interessada em assistir música clássica. A predominância da audiência ficava restrita às classes de renda mais baixa, daquelas que preferem programas populares.
Diante dessa realidade, e vendo o que as outras emissoras estavam fazendo, em curto espaço de tempo a TV Globo roubou o elenco das outras emissoras e desandou a fazer programas de auditório os mais chulos possíveis. Com isso, a audiência subiu, e o nível desceu. Pobre Artur da Távola…
Mas, não ficou por aí. Roberto Marinho fez um contrato controverso com o grupo Time-Life, que lhe deu tudo para manter o nível técnico da emissora, uma espécie de concorrência desleal, que suscitou a reação das concorrentes. O político João Calmon, representando os Diários Associados (Rede Tupi), foi um dos primeiros a botar a boca no trombone, e fez campanha insidiosa contra a TV Globo. Com isso, o contrato denunciado acabou.
Mas, a Globo continuou agindo. No documentário inglês “Beyond Citizen Kane”, que foi proibido de ser transmitido, o cineasta Simon Hartog compara Roberto Marinho a Charles Foster Kane, personagem de Orson Welles. O vídeo, recheado de politicagem, ainda pode ser visto no YouTube:
Nos dias de hoje, a postura governista da Rede Globo é alvo de inúmeras críticas no YouTube, como esta do veterano jornalista Ricardo Feltrin, que mostra o aumento de uso do YouTube, ao lado da Rede Globo, cuja audiência continua em queda livre:
O discurso de Feltrin é um entre os muitos canais do YouTube que condenam os jornalistas do grupo Globo. A rede é e sempre foi a favor do governo vigente. Mas, quando as reportagens começam a ficar politicamente tendenciosas, as críticas no YouTube aumentam, e não há como escapar disso.
As emissoras de TV que tendem a dirigir a cabeça dos ouvintes parecem que precisam cair na realidade do momento. Sem Internet, a “verdade” de todas as notícias ficava em poder delas, e hoje este poder tem pernas curtas, porque é o espectador que pega o seu telefone e grava o que ele quiser. Com esta ferramenta a seu favor, a mentira jornalística pode ser facilmente visualmente desmentida.
O espírito básico do YouTube é permitir que esta realidade exista, como o próprio nome indica: a palavra Tube é o nome usado pelos britânicos para um aparelho de TV, logo o vídeo é necessariamente um documento visual de natureza pessoal.
Neste momento, parece que o único recurso para impedir que o YouTube e as demais mídias sociais alcancem a repercussão que elas têm é forçar uma suposta “regulamentação”, quer dizer “censura”, classificando o que é divulgado como supostamente inapropriado para divulgação.
Se este projeto de castração das mídias sociais se tornar oficial e for exercido, o país estará regredindo décadas, na forma da ausência de liberdade individual e de expressão. Por outro lado, confirmará o autoritarismo daqueles que se travestem em defensores da lei, mas que na realidade querem calar vozes dissidentes, algo bem próximo de um regime de exceção.
Eu estou no grupo daqueles que não vê no ódio e no ressentimento a solução de qualquer problema. Os revoltados deveriam saber contê-los e usar métodos contemporizadores da razão nas críticas formuladas, e de preferência fazê-las de forma construtiva.
Em outras palavras, odiar a Rede Globo pelo que ela já fez e poderá continuar fazendo não vai resolver nada. Qualquer mudança cultural é normalmente lenta, mas elas vão acontecer em algum momento. A longo prazo toda a realidade que ora vivemos no poder da imprensa oficial poderá não ter mais efeito algum. Como disse o poeta, “nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia”. Eu aposto que quem viver, verá! [Webinsider]
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Paulo Roberto Elias
Paulo Roberto Elias é professor e pesquisador em ciências da saúde, Mestre em Ciência (M.Sc.) pelo Departamento de Bioquímica, do Instituto de Química da UFRJ, e Ph.D. em Bioquímica, pela Cardiff University, no Reino Unido.
2 respostas
Olá Paulo…
O Brasil atravessa uma onda de difusão de desinformação e fale-news, cabendo as redes de Rádio e TV’s “sérias” e que possuem concessão pública para operar, gastarem seu tempo checando tudo antes de colocar uma informação no ar. Já “uma parcela” dos provedores de conteúdo do YouTube, tem usado essa plataforma como ferramenta de difusão de notícias falsas, principalmente cometendo atos criminosos espalhando vídeos manipulados, causando pânico na população, e desta forma esses Youtuber’s estão “monetizando fortunas” nesses canais. Então a linha de reciocinio é a seguinte: Se recebeu um vídeo ou uma notícia polêmica, ligue seu rádio ou emssora de tv de sua preferência, e confira se a notícia tem procedência.
Oi, Rogério,
Eu concordo contigo, também acho que existe muita exploração política no YouTube, mas no caso é preciso achar uma emissora com a qual se possa confiar no que é dito, concorda? Aqui em casa, eu parei de assistir a Globo News exatamente por causa disso, independente do que os Youtubers reclamam sobre aqueles jornalistas. Eu continuo gostando muito de alguns jornalistas veteranos de lá, mas o que os outros dizem, com uma clara colocação a favor do sistema, eu prefiro não ouvir. Um jornalista que tem respeito com o público não pode mentir e colocar em outros a pecha de mentirosos.