Jogos que mudaram o mundo nos últimos 100 anos – parte II

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Com Luciene Santos.

Para ler a primeira parte do artigo acesse: Jogos que mudaram o mundo nos últimos 100 anos – parte I.

Ao longo de sua genealogia, os jogos virtuais sempre causaram ‘silenciosas’ transformações reais em diversas áreas da sociedade. Nos âmbitos cultural, social e político, a história dos jogos virtuais é repleta de pequenas ‘revoluções silenciosas’, mas nem tão silenciosas assim a ponto de não serem percebidas. A chamada Cultura dos Games já é uma realidade cotidiana. O game de ação e aventura World of Warcraft encabeça o ranking dos 10 jogos virtuais que transformaram o mundo nos últimos 100 anos.

Conhecido pelos jogadores simplesmente como Wow, o jogo de MMORPG revolucionou o mundo dos games ao alcançar a marca inacreditável de mais de 12 milhões de assinantes, mensalmente. Na perspectiva da sociabilidade, nenhum outro evento virtual pago conseguiu tamanha proeza: reunir numa mesma plataforma midiática um número infindável de pessoas para trocar e exercitar experiências lúdicas com repercussões reais.
wow

  1. World of Warcraft
  2. Super Better
  3. Civilization
  4. The sims
  5. Army Battlezone
  6. Guitar Hero
  7. Counter Strike
  8. GTA
  9. Super Mario
  10. Xadrez

Trata-se de um fenômeno extraordinário quando comparado com uma sala de aula com apenas 40 alunos. Para fazer grandes transformações são necessárias plataformas lúdicas globais. Porque elas contam com uma enorme capacidade de operar grandes revoluções sociais e políticas. Nesses ambientes ‘psicodélicos’ de cognição, a troca de informação ocorre de forma instantânea em tempo real. Porque tudo nos parece urgente! Como a música de Renato Russo:

“…não tenho mais o tempo que passou”.

Sob esse mesmo mantra, o jogo Super Better foi projetado para tentar aliviar a dor e agonia de pessoas que apresentam sintomas de depressão. O jogo inverte a velha lógica do tratamento da doença, ao permitir aos pacientes online trocarem informação entre si sobre questões comuns, sociabilidade que acaba favorecendo a cura. Seguindo a mesma linha de união de forças, o jogo Civilization é uma série de estratégia baseada em turnos, centrado em torno da construção de uma civilização da pré-história até o futuro próximo.

Desde 1991, a franquia já vendeu mais de oito milhões de cópias. Todos os títulos da série possuem uma jogabilidade semelhante. O jogo permite ao jogador mover suas unidades no mapa, construir cidades ou melhorar unidades existentes, e iniciar negociações com os outros jogadores. Idealizado pelo americano Sid Meier, o game alia sociabilidade e gerenciamento logístico, cujas ações encontram aplicabilidade no mundo real.

Da mesma fórmula de sucesso do Civilization, o jogo The Sims é uma das franquias mais bem-sucedidas da história dos games. A fórmula é simples: o jogador cria um personagem e passa a viver a vida dele, subindo na carreira e melhorando a habitação onde mora. Recentemente, o jogo chegou ao Facebook com nome de The Sims Social, mistura que elevou as possibilidades interativas e sociais do jogo. Diversas tarefas dependem justamente da interação entre amigos de rede social.

Jogos levados a sério

Jogo sério – uma tradução literal do inglês serious game, é uma plataforma desenvolvida através dos princípios do desenho de jogo interativo, com o objetivo de transmitir um conteúdo de caráter educativo aos usuários. O termo serious refere-se neste caso a produtos e situações ligadas à área da defesa, da educação, exploração científica, serviços de saúde, gestão de emergência, planejamento urbano, engenharia, religião e política. O primeiro serious game foi o Army Battlezone.

Desenvolvido pela empresa Atari nos anos 1980, o jogo foi criado para treinar militares em situação de batalha. Ao longo dos anos, os serious games foram concebidos para uma gama maior de áreas, como educação, treinamento em empresas, saúde, publicidade e políticas públicas. Esse jogo abriu as portas dos games como ferramenta educativa e de ação social e política. Por outro lado, o Guitar Hero teve uma contribuição cultural, ao revolucionar a forma como interagimos com a narrativa musical.

Violência que ‘esconde’ cognição

Famosos por sua violência escancarada, os games Counter Strike e GTA apresentam uma narrativa iconográfica de dar inveja a muitos filmes de Hollywood, razão pela qual os jogos eletrônicos passaram a ostentar o primeiro lugar no imaginário de crianças e adolescentes em todo o mundo. Não se trata apenas de um fenômeno brasileiro. Apesar da narrativa de extrema violência, esses jogos apresentam de forma subjacente um elevadíssimo poder cognitivo, que as aparências podem nublar.

Os gráficos e os cenários são produzidos com altíssima qualidade, fatores que contribuem para atrair os jovens jogadores. Pois, como afirma Steven Johnson, esses jogos fazem mal se o argumento for sustentado apenas na relação textual, ou na narrativa. Afinal, os jogos de uma forma geral, mas especialmente os violentos, apresentam uma capacidade inigualável de tocar os circuitos de recompensa do cérebro, tamanho é o impacto produzido por sua forma de apresentação, sempre superior a qualquer modelo narrativo.

Por sua vez, há jogos, como Super Mário e Xadrez apresentam uma jogabilidade amigável que não fere nenhum princípio do politicamente correto. No caso do Super Mário, a inocência do personagem é retratada como um encanador italiano baixinho e rechonchudo, que reside no Reino dos Cogumelos. Repetidamente, ele tem a missão de resgatar a Princesa Peach, do vilão Bowser e impedir seus diversos planos de destruir e dominar o reino. Além de educativo, o jogo alimenta o lado altruístico das crianças.

Apesar da aparente ausência de narrativa textual, todos os jogos de mesa, principalmente o xadrez, estimulam o cérebro de uma forma inversa dos jogos eletrônicos, cujo apelo visual ‘direcionaria’ o cérebro mais para a sua jogabilidade. Já no xadrez, o tabuleiro de jogo é totalmente transportado para dentro da cabeça do jogador quando está jogando. Por conta disso, essa categoria estimula mais o lado estratégico, e vence quem conseguir configurar dentro do cérebro dois tabuleiros imaginários: um com a própria tática, e outro com a do adversário. Não é uma coisa simples de se elaborar.

Jogos-notícia que transformam

Sem nenhuma sombra de dúvida, os NewsGames – games baseados em notícias online – configuram-se na maior revolução cognitiva da história da Cibercultura. A fusão entre notícias e games é uma combinação cognitiva altamente transformadora do ponto de vista cultural, social e político. Estaríamos falando da chamada Quinta Onda – o uso de tecnologias e narrativas lúdicas informacionais no centro das transformações da sociedade. O conceito resgata o best seller A Terceira Onda (The Third Wave), do autor Alvin Toffler.

Escrito em 1980, o ensaio de Toffler faz previsões sobre como será a sociedade pós-moderna do século XXI – a Era da Informação, em que mente, informação, conhecimento e alta tecnologia são tipos de capital essenciais ao sucesso das corporações. A primeira onda foi a revolução agrícola e a segunda, a Revolução Industrial. Toffler considera que hoje já vivenciamos a Quarta Onda, em que as empresas só obterão sucesso se adotarem práticas ambientalmente sustentáveis. Contudo, as ações devem apresentar ludicidade informacional.

endgame_syria

  1. EndGame Syria
  2. SuperStructure
  3. Efficiencity
  4. Kabul Kaboom
  5. 12 September
  6. The Race for the White House
  7. Eleições – UAI
  8. UOL Invest
  9. Cartola FC
  10. Diário de Classe

Um bom exemplo dessa transformação são jogos como o EndGame Syria. Criado por uma empresa de games da Inglaterra, o newsgame surgiu na esteira dos protestos em países do Oriente Médio e Norte da África, que culminaram com o advento da chamada Primavera Árabe. A repercussão foi tanta que os novos censores da Apple Store barraram o jogo justamente pelo seu forte conteúdo político. Após o lamentável episódio de censura pública, os games não podem, definitivamente, serem encarados como brinquedinhos sem qualquer valor informacional.

Já os newsgames SuperStructure e Efficiencity trazem uma preocupação ambiental assinalada pela Quarta Onda de Toffler. Mas não é só isso. Eles apresentam uma ludicidade informacional permeada pela chamada Quinta Onda. E defendemos a ‘ludicidade imanente do meio (games) como a sétima característica do jornalismo online, função que garantiria aos jogos online um poder transformador jamais conquistado antes pela sociedade pós-moderna.

Boom dos newsgames eleitorais

Podemos apontar como marco histórico da Quinta Onda o jogo Kabul Kaboom – primeiro newsgame a ser lançado (2001). O game é uma crítica à guerra do Afeganistão, uma resposta do governo americano aos ataques de 11 Setembro, nos Estados Unidos. Idealizado pelo precursor dos newsgames, o espanhol Gonzalo Frasca, a trama em tom de denúncia solicita a participação ativa do jogador, que deve coletar comida e, ao mesmo tempo, desviar de bombas que caem do céu. Após pouco tempo, é fácil perceber que não há como vencer, assim como o jogo 12 September do mesmo autor.

Em 2008 ocorreu o chamado boom dos newsgames eleitorais, formato midiático que mudou para sempre a forma de discussão dos problemas sociais e políticos. Lançado pelo portal de notícias da MSNBC, o jogo The Race for the White House entrou para a história da campanha eleitoral americana, ao funcionar como plataforma de simulação de eleição presidencial com dados jornalísticos reais. Foi em meio a essa revolução midiática que o mundo assistiu à eleição do primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos.

No Brasil vimos o portal mineiro UAI editar o jogo Eleições, o primeiro game eleitoral brasileiro. Já com viés financeiro, o jogo UOL Invest escancarou as portas do até então fechado mercado financeiro. De uma forma lúdica, os jogadores podem aprender como fazer o seu dinheiro render mais no final do mês. Na área esportiva, o newsgame Cartola FC inovou ao permitir que os torcedores de futebol saíssem do mundo da passividade quase total e desfrutassem da sociabilidade associada à hiperinteratividade.

Uma iniciativa nada inocente

Criado pela jovem estudante Isadora Faber, com então 13 anos, o newsgame Diário de Classe funciona como jornalismo de denúncia feito no Facebook. Com conteúdo produzido pelos próprios leitores, o jogo atua como plataforma de registro dos problemas verificados na escola onde Isadora estuda, em Santa Catarina. Revolucionária, a página “Diário de Classe” abre novas perspectivas para mobilização online também por outros setores da sociedade.

No que tange o jornalismo online, a iniciativa de Isadora coloca em xeque os investimentos feitos pela grande mídia brasileira. Talvez esse erro estratégico das empresas de mídia explique por que ainda hoje a maioria das pessoas não consegue perceber o valor informacional dos jogos, sejam eles jogados em ambientes reais ou virtuais. Contudo, na prática, eles já revelaram a sua face transformadora da sociedade. O que os impede de crescer? O próprio mercado de jogos! Porque só interessa às empresas produtoras aquilo que conseguem monetizar.

O resto é colocado de lado para não atrapalhar o fantástico negócio dos jogos apenas como recreação. Isso nos faz lembrar dos recentes protestos ocorridos durante a Copa das Confederações. Não interessava à FIFA e às empresas patrocinadoras relacionar informação e notícia com entretenimento, pois isso não seria nada bom para os negócios.  Essa lógica inversa de encarar a sociedade é construída apenas para alienar. Olhando agora da janela de seu quarto, você consegue vislumbrar um mundo de oportunidades… O que te impede de sair agora, ir conhecê-lo e conquistá-lo? [Webinsider]

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Geraldo Seabra, (@newsgames) jornalista e professor, mestre em estudos midiáticos e tecnologia, e especialista em informação visual e em games como informação e notícia. É editor e produtor do Blog dos NewsGames.

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